Nasceu em Cataguases Minas Gerais em 28 de junho de 1916 e foi estudar no Seminário de Mariana, também em Minas. Muito criativo e irrequieto, foi expulso duas vezes do colégio. Se a igreja perdeu um seminarista, o rádio ganhou um de suas maiores figuras.Era irmão do grande pioneiro do nosso cinema, Humberto Mauro. Veio para o Rio em 1936 e foi ser repórter do jornal "A Noite".Formou-se em Direito, mas adorava o jornalismo. Colaborou com as revistas "A noite ilustrada", "Carioca" e "Vamos ler". Em 1937,pegou o elevador e subiu alguns andares do prédio de A Noite e foi saber que negócio era esse de rádio... ingressou na Rádio Nacional do Rio de Janeiro fundada no ano anterior.Pronto! Apaixonou-se pelo rádio e por lá ficou. Inicialmente atuou como redator comercial, criando um elogiado estilo de acabamento dos anúncios comerciais. Em 1939, três anos depois, tornou-se diretor artístico da emissora, cargo que exerceu por sete anos.
José Mauro: para sorte do rádio não foi seminarista
José Mauro ensaia radioatrizes:
fazia radio com amor e talento
Luiz Carlos Saroldi pesquisador da carreira de José Mauro
Escreveu também novelas radiofônicas para a Rádio Nacional, entre as quais, "Abismo", "Encontrei-me com o demônio" e "A sombra de Berenice". Por essa época, criou também o programa "Dona música".
Em 1946, a convite de Gilberto de Andrade, transferiu-se para a Rádio Tupi assumindo a função de diretor artístico e criando programas como "Colégio musical", "Doutor Sabugosa", "O feiticeiro dó-ré´mi" e "Alice no país da música". Em 1948, assumiu a direção geral da Rádios Tupi e Tamoio, cargo que exerceu por três anos. Voltou para a Rádio Nacional e lá seguiu dando asas à imaginação, criando os programas "Cavalgada da alegria", "Invasão do samba", juntamente com Lamartine Babo, João de Barro, Mário Lago e outros, "Epopeia do samba", com Pixinguinha; "Revista Souza Cruz", com Jararaca e Ratinho e "Tabuleiro da baiana", com Ismênia dos Santos, Zezé Fonseca e outros.
Ismênia dos Santos:
uma das radioatrizes que atuou com José Mauro em "No tabuleiro da Baiana"
Zezé Fonseca interpretava os belos textos do radialista
Ísis de Oliveira explicou a dinâmica dos programas montados
Na flauta Radamés e Chiquinho do Acordeão:
retoques finais antes de entrar no ar.
Radamés Gnatalli:
grandes arranjos para os programas montados da Nacional
Paulo Tapajós, Joubert de Carvalho e Leo Peracchi:
o primeiro era diretor musical da Nacional. Peracchi fazia os arranjos para as músicas de Joubert
Lamartine Babo: parceiro de José Mauro em musicais do rádio
Braguinha e José Mauro:
garantia de grandes programas musicais
José Mauro escrevia programas para as exibições
da orquestra de Pixinguinha
Jararaca e Ratinho:
riso e música em "Cavalgada da alegria"
José Mauro era realmente irrequieto! Tanto assim que em 1952, a convite de Gilberto Martins, sempre ele, transferiu-se
para a recém inaugurada Rádio Eldorado atuando como produtor criando programas de sucesso como
"Contos musicais" e "Rádio teste musical". Em 1955, retornou às Emissoras
Associadas assumindo a direção da Rádio Tamoio, a fim de dar-lhe um formato
exclusivamente musical, criando o programa "Música, exclusivamente música". Foi
o primeiro diretor da antiga TV Tupi. Produziu também programas para a
televisão, entre os quais, "Moto música", considerado o primeiro musical da
televisão em forma cinematográfica. Foi produtor do primeiro show de televisão
no Rio de Janeiro, "Atrapalhados com televisão". Atuou também como produtor da
Rádio e TV Record de São Paulo. Em 1956, foi escolhido pela revista
"Radiolândia", em votação que reuniu toda a equipe de redatores e repórteres, o
"melhor produtor musical" do ano.
Em 1972, tornou-se diretor geral dos Diários e Emissoras Associados. Lecionou sobre rádio, jingles e televisão na Associação Brasileira de Propaganda. Em 1977, recebeu em Toronto no Canadá o prêmio máximo já concedido ao Rádio brasileiro escolhido pelo fórum da revista Bilboard como o melhor diretor internacional de programação de Rádio daquele ano.
Em 1982, gravou depoimento sobre o Rádio no Brasil com Luiz Carlos Saroldi
UM MITO DOS PROGRAMAS MONTADOS
Vamos falar um pouco de Rádio
Almanaque Kolinos, que era um desses programas montados, ou seja, programas de alto nível e produção cara, pois contava com elenco de radioteatro,grande orquestra e coro. Tudo ao vivo! Geralmente noturnos, eram bancados por grandes patrocinadores.
Em Radio Almanaque Kolinos, José Mauro selecionava
um tema e o desenvolvia sob diversos aspectos, ilustrando-o com cenas de
radioteatro emolduradas por uma trilha
musical,especialmente produzida, executada pela grande orquestra. Era uma
trilha para cada programa. Um verdadeira
obra-prima musical que pontuava as ações encaminhadas por uma narrador, tudo
muito cronometricamente.
O
ensaio era duas horas antes do programa entrar no ar. O diretor musical
Paulo Tapajós possuía um perfeito entrosamento com o ensaiador do programa de
maneira que as falas do narrador e a
participação dos radioatores, casasse perfeitamente com o tamanho das frases
musicais.
Celso Guimarães: narrador do Radio Almanaque
Programa montado:
inauguração do novo auditório da Tupi em 1950
No ar: "Um milhão de melodias, patrocínio de Coca Cola"!
Radamés Gnatalli a frente da orquestra Nacional
O profissionalismo dos músicos da
orquestra era de alto nível. Todos professores,
liam suas partituras de “primeira”. O mesmo acontecia com os atores.
A radioatriz Ísis de Oliveira
conta: nestes programas havia um ensaio
no andar 22 com o diretor que geralmente era Floriano Faissal. Em seguida o
elenco descia para o grande estúdio do 21 onde já estava a orquestra reunida e
então era feita uma leitura com a orquestra.Acontece que nem sempre esse ensaio
com a orquestra era possível se fazer. Nós atores, ficamos então atentos ao
Floriano, o qual, entrosado com o maestro dava os sinais para nossas entradas,
pausas ou velocidade de leitura.
Havia muito profissionalismo,
tanto por parte da orquestra quanto do elenco e assim tudo saia perfeito!
Havia, portanto, a figura do
maestro à frente da orquestra que dava
sinais ao ensaiador, para a entrada dos atores no momento de suas falas.
Floriano, horas antes, fazia ele,
um ensaio com o maestro e marcava os tempos das músicas em seu script. Dessa
maneira ele tinha condições de ir dando os sinais para os atores, que deveriam
ler as falas no tempo certo da música. Era uma enorme responsabilidade que
exigia do diretor ter bom ouvido, sensibilidade e segurança no momento de dar
os sinais. Floriano aprendera essa técnica com Vitor Costa.
Muitas vezes, ainda menino, participei de histórias infantis para os
famosos Festivais GE, nas noites de terça-feira. O maestro Leo Peracchi
escrevia umas trilhas lindas que eram executadas pela sinfônica da rádio. Vitor
Costa tinha um código. Mão no meu ombro. Quando apertava era para eu falar.
Quando soltava eu parava, dando uma pausa, para a orquestra poder subir. E era
assim. Dava tudo certo! Conta Abelardo Santos.
Abelardo Santos e Marion Duarte no dia do lançamento de A Era do Radioteatro com o autor do blog
Abelardo Santos atuava nos grandes programas montados da Nacional
Enquanto isso no controle de som, havia
um segundo maestro, que, com a partitura
e o roteiro à sua frente dava ordens, ao
operador de um microfone que se
deslocava sobre uma base acima das
cabeças dos músicos. Esse microfone era chamado de girafa ou “boom”. Era uma
base com rodas, onde se prendia uma haste com o outra haste em ângulo de 45
graus de onde pendia um microfone.
A fim de captar melhor o som dos instrumentos da orquestra, o operador do boom, sob as ordens do segundo maestro
que lhe chegavam pelos headphones, deslocava o girafa segundos antes para junto desse
ou daquele instrumento ou grupo de instrumentos musicais.
Toda essa importante manobra se processava para suprir uma deficiência das
mesas de som da época.
Essas mesas só podiam receber 4
microfones. Os técnicos descobriram que,
ligando os microfones em série, se poderia obter um resultado tal, como se
tivéssemos oito microfones.
O passeio do boom pelo estúdio, se aproximando dos instrumentos na hora certa,
funcionava como se tivéssemos em mãos diversos microfones, evitando-se, assim,
que um instrumento abafasse o outro o que produziria um “som chapado” que os maestros odiavam..
A manobra do boom está muito bem
descrita no excelente livro de Luis
Carlos Saroldi e Sonia Virginia Moreira denominado Nas ondas da rádio Nacional onde os autores dão um título muito
espirituoso ao relato de Paulo Tapajós:
“Uma girafa passeia pelo estúdio”.
Rádio Almanaque, Festivais GE, A canção da lembrança e outros
programas do gênero eram gravados conforme iam ao ar, em discos de acetato de
16 polegadas. Terminado o programa toda
a equipe se reunia num estúdio ocioso ou na discoteca e ouvia o programa.
Era um laboratório, uma auto-avaliação
do que havia ido ao ar e se analisava técnica e artisticamente a produção,
corrigindo falhas, buscando um aprimoramento.
Por isso a Nacional se transformou, no decorrer dos anos, em um
verdadeiro modelo, uma referência no rádio de sua época.
Uma escola de rádio.
E José Mauro era um dos mestres
dessa escola.
Houve um período em que José Mauro foi para a Tupi.
E levou junto seu talento, para escrever Instantes Sinfônicos, também um
programa montado transmitido do auditório
com grande orquestra, coro e elenco de radioteatro do qual fazia parte a
jovem adolescente contratada da Tupi, Aliomar de Matos. É ela que nos conta:
O programa ia ao ar à noite, no horário nobre.Fazíamos o ensaio e
descíamos para o palco-auditório,vestindo as melhores roupas, como se fôssemos
para uma festa. Lá estava a orquestra, o coro e todo o elenco. Na plateia do
lindo e confortável auditório, pessoas bem vestidas e comportadas. Eu adorava
participar desse programa. Tudo maravilhoso!
Quando José Mauro foi para a Tupi
o Rádio Almanaque conheceu outros
produtores. Em certo período Haroldo Barbosa alternava com Paulo Roberto a
redação do programa. Lourival Marques o escreveu nos anos cinquenta.
Paulo Roberto se revezava com José Mauro em Radio Almanaque
A produção do programas montados
era trabalhosa, porque exigia muita pesquisa e criatividade para quem produzia
e fôlego e talento para quem realizava. Mas tudo isso era o que não
faltava àqueles radialistas.
JOSÉ MAURO E CORAGEM DE MUDAR A
CARA DO RÁDIO NO FINAL DOS ANOS 50.
José Mauro, em 1955 quando sentiu que o rádio precisava fazer alguma
coisa para se adaptar aos novos tempos e
à forte concorrência da televisão, foi dirigir a Rádio Tamoio, como dissemos e lá,
junto com a equipe dos “bacharéis da música”
criou uma programação revolucionária
cujo lema era : “Tamoio, música, exclusivamente música”!
Eu trabalhava na rádio nessa
época, fazendo parte da equipe de esportes de Oduvaldo Cozzi, produzindo um
programa diário às cinco e meia da tarde, chamado A juventude e o esporte. A Tamoio, até então era uma emissora que
só se dedicava ao esporte.
Quando a nova programação estreou em 1957,t odos nos bandeamos para a Rádio
Tupi.
Porém, infelizmente não pude
acompanhar o grupo. Tive que largar
o rádio para prestar o serviço
militar,servindo 11 meses no forte de Copacabana de onde testemunhei a revolução
que José Mauro fez na Tamoio. Todo o estúdio de radioteatro foi reformado.Adeus
material de contrarregra e efeitos. A técnica recebeu modernos toca-discos que
só executavam long-plays.
Linhas telefônicas foram ampliadas para receber as ligações dos ouvintes
votando em Músicas na passarela e as
prateleiras da discoteca foram reformuladas para guardar só discos de 33 e 45 RPM.
Rapidamente a emissora pulou do magros
2% do IBOPE para índices significativos.
O faturamento aumentou com um baixíssimo custo de produção.
José Mauro ao marcar mais um tento, anuncia a chegada de uma nova
era : o rádio musical, que viria a se
consolidar anos depois com o advento do
FM e do rádio digital.
A era dos grandes programas montados
chegava ao seu final. A novidade da televisão atraia patrocinadores,
possibilitando que as televisões pudessem formar e remunerar seus elencos. Orquestras,
os conjuntos musicais, grandes cantores,
atores, técnicos... movimento migratório em direção à tevê. Os estúdios de
rádio sofrem reformas e diminuem de tamanho. O caminho agora é música, radiojornalismo e rádio de serviço público.
Coube a José Mauro dar a saída a
caminho de uma nova era no rádio.
Belo artigo homenageando o grande radialista José Mauro! Obrigada por compartilhar esses conhecimentos.
ResponderExcluirSempre tive José Mauro como um pioneiro de muito sucesso nas rádios da então capital do Brasil, com uma genialidade nascida só da cabeça dele pois tudo o que produzia era original, nada copiado das rádios dos países mais desenvolvidos.
ResponderExcluirAssim, nenhuma surpresa que tenha sido chamado para fazer sucesso no início da televisão no Brasil, época em que, não havendo ainda gravação em TV, tudo era feito ao vivo e em preto e branco. E êle fez pioneira e magníficammente, sempre com a preocupação de inovação e boa qualidade. Dava duro, mas contente com a consagração que o público lhe deu. Simplesmente um gênio.
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ResponderExcluirEspetacular! Lembro-me muito bem do tio Zé Mauro em suas palavras sábias nas nossas conversas em sua casa em Volta Grande.