terça-feira, 19 de janeiro de 2016

1936-2016 RADIO NACIONAL 80 ANOS!



   Embora a grande maioria das emissoras de rádio do eixo Rio-São Paulo exibissem uma programação de novelas e programas de radioteatro, sem dúvida, foi a Nacional do Rio, que melhor desenvolveu esse gênero que era de tanto agrado entre os ouvintes. Vamos, portanto continuar falando do radioteatro do Nacional.

A REALIDADE E A FANTASIA DO OUVINTE.

Muitos ouvintes, com frequência, misturam realidade com fantasia. Isto acontece até hoje nas telenovelas, quando confundem  Persona com pessoa.
 Em A bela e a fera, Henriqueta Brieba (lembram-se dela na deliciosa comédia  Por falta de roupa nova passei o ferro na velha quando já estava com quase 90 anos?) no final dos anos 40 interpreta uma mulher muito má. De tantas maldades que fez com Ismênia dos Santos, acaba, no derradeiro capítulo, louca, vagando pelas ruas e servindo de galhofa para os moleques e júbilo dos ouvintes.
Henriqueta Brieba:
 sucesso nas radionovelas, migrando depois para a Globo


Ela atuou em teatro até a morte

Uma tarde, Henriqueta recebe recado para retirar no serviço de correspondência da Nacional uma enorme caixa de papelão que havia chegado pelo correio.
Feliz da vida, imaginando um presente que uma ardorosa fã lhe havia mandado.
Ao abrir a caixa, na frente dos curiosos  funcionários, o que viu foi uma grossa corda de uns 2 metros, e um bilhete que dizia:

“Esta corda é para você se enforcar, para pagar as maldades que fez na novela, sua megera”!
Esta história me foi contada por Daisy Lúcidi.

Daisy Lúcidi: 
 na Nacional desde os anos 40', me contou esta história.



                                                                Anos 50': 
                  excelente Elza Gomes, que vivia um papel de megera numa novela da Nacional,                                quase foi agredida numa feira por uma fã  revoltada com suas maldades.


QUAL DE VOCÊS É A GENOVEVA? QUERO QUEBRAR  A CARA DELA!

Carmem Sheila me contou a seguinte história. Houve nos anos 50 uma novela na Nacional escrita por Amaral Gurgel. Chamava-se a Menina da saudade e se passava no interior de uma fazenda no tempo da escravidão. O senhor do engenho, homem rico e poderoso, amiúde escolhia uma negrinha filha de escravos para transar. Eis que uma delas engravida. Nasce, então, uma menina que cresce e se transforma numa linda mulata, de feições finas e olhos esverdeados. Por outro lado, o dono da fazenda tem também uma filha com a esposa. Sendo a filha branca um pouco mais nova que a mulatinha. A fim de manter esta sempre por perto da casa grande, o dono reserva à negrinha a missão de ajudar a tomar conta da filha legítima. As duas crescem e brincam juntas. Ocorre que a branca, Genoveva era seu nome, era feia que nem a necessidade, contrastando com a beleza da mulatinha. Por inveja e despeito Genoveva está sempre fazendo maldades com a mulatinha, sem que esta possa se defender dada a enorme distância social. Os ouvintes tomam as dores da mulatinha e passam a ter ódio de morte por Genoveva.  Cartas e cartas chegam à emissora condenando a jovem megera e assumindo as dores da indefesa mulatinha. A novela seguia outras vertentes, mas a história das duas meninas, que fora concebida por Gurgel para ser uma história  secundária, repercutiu tanto, que superou o interesse da linha mestra da radionovela.
Numa tarde, uma ouvinte revoltada,  invade a sala de ensaios com a intenção de  agredir  a jovem atriz que interpretava a Genoveva. E dirigindo-se para as duas jovens atrizes, que estavam sentadas  lado a lado segurando seus roteiros exclama: Qual de vocês é a Genoveva? Quero quebrar a cara dela!.Sorte das duas, que a ouvinte não pode concretizar o ato, impedida que foi por outros artistas.

Carmem Sheila, começou adolescente no radioteatro da Nacional...


...hoje dubladora de sucesso. Eis alguns personagens que ganharam sua voz.



 DOUTOR MENDONÇA ATENDE NO CORREDOR DA RÁDIO.
 FÃ ENTREGA UM ENXOVAL DE BEBÊ A ÍSIS DE OLIVEIRA.

Mas havia também o outro lado: uma senhora, apaixonada pela voz de Saint-Clair Lopes, o seu Benjamim, de “Em busca”...  decidiu doar em cartório, com reserva de uso e fruto, (citam algumas fontes, por testamento, segundo outros autores), seu único e modesto apartamento onde morava. Como não tinha herdeiros, doou
para “aquele que,  por meio da voz lhe tinha trazido tantas e tantas emoções através de seus personagens”.
Saint- Clair Lopes herdou apartamento de uma admiradora

Ísis de Oliveira:
 gravidez da personagem em novela a fez receber enxoval completo de bebê.

Em busca da Felicidade” por ser uma novidade para os ouvintes, criou nesses uma empatia em que fantasia e realidade se confundiam.
Floriano Faissal,  o doutor Mendonça, se vestia muito bem.  Gostava dos ternos brancos, inclusive os sapatos, como era moda nos anos 40.
Certa tarde, uma senhora foi à rádio dizendo que queria falar com o doutor Mendonça.
O porteiro,  encaminhou-a ao Floriano, lógico.
Ao vê-lo no corredor o cumprimentou e chamando-o sempre de doutor Mendonça, pediu que Floriano a examinasse pois estava com um "problema abdominal".
O ator  tentou explicar à ouvinte que ele não era a pessoa indicada para cuidar dela e para não magoá-la sugeriu que procurasse o doutor Paulo Roberto.Lembrando a vocês, que Paulo Roberto, acumulando a medicina com o rádio produziu na Nacional, Obrigado doutor, Nada além de dois minutos, Gente que brilha, Honra ao mérito e outros programas memoráveis.

Paulo Roberto obstetra na Maternidade de Cascadura, Zona Norte do Rio.
Paulo Roberto radialista de raro talento.


Desconheço o final dessa história, que  foi contada pelo próprio Floriano, durante uma palestra que coordenei na Universidade do Estado do Rio de Janeiro com a professora Marlene Blois em  22 de outubro de 1984
Mais adiante falarei da grande figura de Paulo Roberto, médico e radialista da Nacional.
Citando outro fato, em que ouvintes confundem realidade com fantasia, lembro que
em O direito de nascer, Ísis de Oliveira que interpreta a jovem Maria Helena do Juncal, recebeu um enxoval completo de bebê, quando sua personagem engravidou e foi desprezada pelo pai o terrível Dom Rafael do Juncal.Sobre essa novela falaremos mais adiante.
Certa vez Rodolfo Mayer quase foi agredido por um grupo de ouvintes. Elas não aceitavam ver o personagem interpretado por ele,um homem sem escrúpulos,que engravidara uma jovem (Iara Sales), omitindo que era casado com uma senhora decente(Zezé Fonseca). O pequeno grupo ludibriou a segurança e partiu para cima do Rodolfo ofendendo-o. Eu e outros companheiros entramos no meio e tiramos o Rodolfo do sufoco. Contou Floriano Faissal em depoimento ao Museu da Imagem e do Som.
Rodolfo Mayer: seu personagem, embora casado com o de ...

Zezé Fonseca ...


..."engravida" a mocinha Iara Salles.
   Revolta entre a opinião pública.

Saint-Clair Lopes foi outro que recebeu ameaças por carta e pessoalmente, ao interpretar uma peste chamada Manuel Justino na novela  Renúncia,sucesso que ia ao ar às 9 da noite nos anos 40.

  Com frequência,  nos dias atuais, quando a radionovela cedeu seu lugar à telenovela, os fans seguem confundindo o personagem com o ator. Isto se deve a diversos fatores, entre eles a empatia, a simpatia ou a antipatia que pessoa e persona produzem na emoção dos ouvintes, no passado e dos expectadores nos tempos de televisão. Na época da radionovela, já falamos, em nosso blog, a tamanha influencia exercida pelo veiculo rádio na nossa sociedade. 

Anos 30': ouvindo rádio em família.


No pós-guerra, o lema era: 
"um rádio para cada aposento da casa".



Nenhum comentário:

Postar um comentário