sábado, 1 de março de 2014

O RÁDIO E O CARNAVAL DO PASSADO

   Entre os anos 30 e meados dos  60 o Rádio reinou como o grande meio de comunicação de massa deste país. As revistas eram poucas, os jornais, embora participativos da história brasileira, não atingiam a grande massa. A televisão cobria apenas as grandes cidades. O Brasil, um pais predominantemente rural, assistiu a chegada da industrialização apenas   no final dos anos 50. A liderança absoluta do rádio fazia com que as grandes verbas de publicidade fossem para ele carreadas. O Rádio  poderia assim manter seus grandes elencos: orquestras, músicos, cantores, produtores, atores e técnicos.
   Quando o carnaval se aproximava, lá pelos meados de dezembro, a industria cinematográfica brasileira se encarregava de lançar filmes muito populares: as chanchadas da Atlântida. Famosas comédias que consistiam em um fio de história entremeada por um desfile de cantores populares interpretando os sucessos do carnaval que estava para chegar. Os cantores eram todos do Rádio e essa era a maneira pela qual os ouvintes poderiam, finalmente, ver  seus admirados artistas. Filas imensas se faziam ao redor dos cinemas das principais cidades do  país. Após o Natal começava a temporada do carnaval. Revistinhas eram vendidas com as letras das alegres e criativas marchinhas ou  dos deliciosos sambas carnavalescos. O Rádio as executava à exaustão, através das gravações ou em programas carnavalescos ao vivo, diretamente dos auditórios das principais emissoras, sob o patrocínio de fábricas de cerveja e refrigerante. Muitas dessas marchinhas e sambas ficaram na memória  até hoje.
Executadas nos salões e nos blocos, essas músicas conseguem  resistir ao novo formato do carnaval de hoje, sobrevivendo no imaginário do folião de todas as idades!
Vamos mostrar para vocês as fotos de alguns desses intérpretes e as letras de algumas das milhares de músicas que heroica e teimosamente  tentam resistir ao tempo.



Francisco Carlos nasceu no Rio no dia 5 de abril de 1928, mas mudou-se muito cedo para o Recife. Só voltou para a cidade maravilhosa aos 11 anos de idade. Mais tarde formou-se na Escola Nacional de Belas Artes. Nessa época começou a apresentar-se nas rádios fluminenses até ser contratado como cantor profissional da Rádio Tamoio em meados de 1945.
Como cantor de rádio passou ainda pela Rádio Globo onde alcançou grande notoriedade. Apenas em 1950 Carlos chegou aos estúdios para gravar seu primeiro disco. Lançado pela RCA o álbum trazia a marchinha Meu Brotinho e o samba Me Deixa em Paz. As duas canções foram compostas por Humberto Teixeira e Luís Gonzaga.


Linda Batista foi Rainha do Rádio por vários anos. Fazia sucesso o ano inteiro, porém no carnaval era destaque maior.Quem não se lembra de Nega Maluca, que virou até fantasia de carnaval?

Tava jogando sinuca,
Uma nêga maluca, me apareceu,
Vinha com um filho no colo,
E dizia pro povo, que o filho era meu. (bis)
Não senhor,
Tome que o filho é seu,
Não senhor,
Guarde que Deus lhe deu. (bis)

Há tanta gente no mundo,
Mas meu azar é profundo,
Veja você meu irmão,
A bomba, estourou na minha mão,
Tudo acontece comigo,
Eu que nem sou do amor...
Até parece castigo,
Ou então influencia da cor !.
..
Composição: Ewaldo Ruy / Fernando Lobo ·

Lamartine Babo, compositor de ano inteiro, mas que fez marchinhas que se transformaram em verdadeiros hinos do carnaval.
Quem não se lembra de ...
O teu cabelo não nega, Lamartine Babo e Irmãos Valença, gravado por Castro Barbosa?
E essa Linda Morena?

“Linda morena, morena, morena que me faz penar / A lua cheia, que tanto brilha / Não brilha tanto quanto o teu olhar”, cantavam os foliões românticos em 1934, ano também da malandragem de Moleque indigesto, da filosofia de A tua vida é um segredo, do recado de Aí, hein?, “pensas que eu não sei / Toma cuidado, pois um dia eu fiz o mesmo e me estrepei” e da versão carnavalizante da  História do Brasil, que vai de Peri e Ceci à Ioiô e Iaiá, do guarani ao guaraná. Linda morena é uma marchinha ingênua, alegre, lírica. Fez muito sucesso e com sua popularidade inspirou várias paródias.


NUNO ROLAND – Sucesso constante no carnaval. Em 1946 estourou com a famosa marchinha de autoria de João de Barro.
Lembram-se?

Eu sou o pirata da perna de pau
Do olho de vidro da cara de mau

Minha galera 
Dos verdes mares não teme o tufão
Minha galera
Só tem garotas na guarnição
Por isso se outro pirata 
Tenta a abordagem eu pego o facão
E grito do alto da popa:
Opa! homem não! 

 Carnaval no programa de Paulo Gracindo. Os palhaços Fred e Carequinha e a cantora Ângela Maria


Esta é  Carmen Costa, que  nasceu em 1929 no município de Trajano de Moares interior do Rio de Janeiro.
Trabalhou como empregada doméstica na casa  de Francisco Alves. Numa festa ele a fez cantar para os convidados, entre eles estava a famosa Carmem Miranda que  e a incentivou a iniciar uma carreira.
Se apresentou como caloura no famoso programa de Ary Barroso saindo vencedora. Passou a cantar profissionalmente e a fazer dupla com o cantor e compositor Henricão.
Seu primeiro sucesso foi Está chegando a hora, versão de Cielito Lindo, canção mexicana , tudo isso em 1940. Em 1945, casou-se com o americano Hans Van Koehler e foi viver com ele nos Estados Unidos. Passou uma temporada em Los Angeles e, em Nova York, esteve no concerto histórico no Carnegie Hall, que marcou a bossa nova nos Estados Unidos, em 1962.
Em 1950 voltou ao Brasil, quando conheceu o compositor Mirabeau Pinheiro, com quem viveu um romance por cinco anos e com quem teve sua única filha, Silésia. Juntos tiveram sucessos como Cachaça não é água (quando foram acusados de plágio) e Obsessão.
Vamos lembrar o primeiro sucesso de Carmem Costa?

Quem parte leva saudades de alguém que fica chorando de dor 
Por isso eu não quero lembrar quando partiu meu grande amor 
Ai, ai, ai, (ai, ai, ai) está chegando a hora 
O dia já vem raiando, meu bem, eu tenho que ir embora 

Ai, ai, ai, (ai, ai, ai) está chegando a hora 
O dia já vem raiando, meu bem, eu tenho que ir embora 


E quem não se lembra da marcha do Cordão do Bola Preta, até hoje sucesso nos blocos e salões?

  Quem não chora não mama 
Segura meu bem a chupeta 
Lugar quente é na cama 
Ou então no Bola Preta. 

Vem pro Bola meu bem 
Com alegria infernal 
Todos são de coração 
Foliões do Carnaval 
(Sensacional!)


Jorge Goulart fazia tanto sucesso que foi chamado por muitos de rei do carnaval.Quem não se lembra de A Voz do Morro, de Zé Keti? 
Foi também um dos responsáveis pelo êxito da famosa marchinha Cabeleira do Zezé.


Olha a cabeleira do Zezé
Será que ele é?
Será que ele é?
Olha a cabeleira do Zezé
Será que ele é?
Será que ele é?
Será que ele é bossa nova?
Será que ele é Maomé?
Parece que é transviado
Mas isso eu não sei se ele é
Corta o cabelo dele!
Corta o cabelo dele!
Corta o cabelo dele!
Corta o cabelo dele!
Os autores são João Roberto Kelly e o radioator Roberto Faissal. João Roberto conta que estava em um bar na Zona Sul e que o garçom que o servia tinha uma vasta cabeleira. De imediato começou a batucar na mesa e a escrever os versos. Que hoje não seriam considerados politicamente corretos.


Roberto Faissal, brilhante radioator da Nacional, parceiro de João Roberto Kelly.
Dia seguinte João Roberto mostrou a composição, ainda incompleta, a Roberto Faissal. Faissal ajudou a completar a segunda parte e usando de seu prestígio na Rádio Nacional,  levou a marchinha para o Jorge Goulart gravar. Goulart era um campeão dos carnavais e marchinha fez enorme sucesso.
João Roberto escreveria também Mulata Iê, Iê,Iê, Marcha do Remador, Rancho da Praça Onze e muitos outros sucessos.

BLECAUTE

Vamos falar agora de um dos maiores cantores de carnaval de todos os tempos. Blecaute ou BlackOut, como também é grafado. Vida difícil, pois aos seis anos ficou  órfão de pai e mãe. Foi levado  para São  Paulo, onde trabalhou como engraxate jornaleiro. Queria ser cantor e foi tentar a sorte no programa de calouros A Peneira de Ouro, na Rádio Tupi. Em  1941 já cantava na Rádio Difusora, adotando o  BlackOut (sugerido pelo compositor  Capitão Furtado)  de Black-out, aportuguesado para Blecaute.
Em 1942 contratado pela Rádio Tamoio, foi para o Rio de Janeiro, onde apresentou-se também na Rádio Mauá e na Rádio Nacional.
Em 1944 participou, como cantor, do filme Tristezas não Pagam Dívidas e gravou o primeiro disco, Eu agora Sou Casado.
O carnaval de 1949 trouxe os grandes sucessos "O Pedreiro Valdemar" (de Wilson Batista e Roberto Martins) e "General da Banda" (Tancredo Silva, Sátiro de Melo e José Alcides), que lhe valeria a alcunha que carregaria para o resto da vida.

Em 1954, faria participações nos filmes Malandros em Quarta Dimensão , de Luiz de Barros, e O Rei do Movimento de Victor Lima e Hélio Barroso. Ai vai a letra de um de seus inúmeros sucessos, Maria Candelária de autoria da dupla também campeã dos carnavais: Klecius Caldas e Armando Cavalcanti.


Maria Candelária / É alta funcionária
Saltou de paraquedas / Caiu na letra "O", oh, oh, oh, oh
Começa ao meio-dia / Coita da Maria
Trabalha, trabalha, trabalha de fazer dó oh, oh, oh, oh
A uma vai ao dentista / As duas vai ao café / Às três vai à modista
Às quatro assina o ponto e dá no pé / Que grande vigarista que ela é.


O assunto agora é a estrela  Dalva. A rainha Dalva de Oliveira!

 
                              
DALVA DE OLIVEIRA - De voz afinada, e bela, considerada a Rainha da Voz ou o rouxinol brasileiro, sua extensão vocal  ia do contralto ao soprano.            Em 1937,  Dalva gravou, junto

com a Dupla Preto e Branco, o batuque Itaquari e a marcha Ceci e Peri, ambas do Príncipe Pretinho. O disco
 foi um 

sucesso, rendendo várias apresentações nas Rádios. Foi

 César Ladeira, em seu programa na Rádio Mayrink 

Veiga, 

que pela primeira vez anunciou o Trio de Ouro. Em 1949

 deixou o trio, quando excursionavam pela Venezuela com a

 Companhia de Dercy Gonçalves. Em 1951 retomou a

 carreira solo, lançando os sambas Tudo acabado (J.

 Piedade e Osvaldo Martins) e Olhos verdes (Vicente Paiva) 

e o samba-canção Ave Maria (Vicente Paiva e Jaime

 Redondo), sendo os dois últimos grandes sucessos

 da cantora. No ano seguinte foi eleita Rainha do Rádio, e

 excursionou pela Argentina, apresentando-se na Rádio El

 Mundo, de Buenos Aires, na qual conheceu Tito Clement,

 que se tornou seu empresário e depois marido, pai de sua 

filha, como mencionado anteriormente. Ainda em 1951,

 filmou Maria da praia, dirigido por Paulo Wanderley, e

 Milagre de amor, dirigido por Moacir Fenelon.

Entre os inúmeros sucessos que gravou para os carnavais,

 destacamos este, que muitos conhecem e cantado até hoje:

Bandeira Branca. O autor é Max Nunes.

Max Nunes: eu estava assistindo  um documentário na tevê sobre a guerra e vi uns soldados acenando com uma bandeira branca pedindo paz ao inimigo. Foi quando me veio a ideia de escrever Bandeira Branca.

Bandeira branca, amor
Não posso mais.
Pela saudade
Que me invade eu peço paz.
Saudade, mal de amor, de amor...
Saudade, dor que dói demais...
Vem, meu amor!
Bandeira branca eu peço paz.


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