terça-feira, 28 de janeiro de 2014

HOMENS QUE ESCREVIAM OS PROGRAMAS DE RÁDIO


DIAS GOMES
Foi um nome importantíssimo no radioteatro, tendo depois se transferido para a televisão, enriquecendo a teledramaturgia com seu enorme talento. Foi também escritor e autor de teatro, tendo ingressado na Academia Brasileira de Letras. Antes de vir para a Nacional, fez sucesso no rádio paulista e depois no Rio, na Rádio Tamoio. Na Nacional destacou-se muito pelo fato de escrever durante vários anos uma peça completa que ia ao ar todas as 6as.feiras às 22 e cinco. Era o Grande Teatro que recebeu o nome De Millus que patrocinava  a audição. Depois passou a chamar-se “Grande Teatro Orniex” fabricante do Lustra-móveis Shell.
 O Grande Teatro era um velho projeto de Dias Gomes e isto porque, por volta do ano de 1944 ele estava em São Paulo e na rádio Pan-Americana escrevia o Grande Teatro  Pan-Americana. Era uma peça  completa por semana com uma hora de duração. Um trabalho magistral de concisão, pois Dias Gomes tinha a capacidade de transformar em um radioteatro de 60 minutos, um romance ou uma peça teatral famosa.
Quem dirigia essa rádio era Oduvaldo Viana. No final de 1944 ele vendeu a emissora e veio para o Rio,  desmoronando-se assim toda a estrutura radioteatral que ele havia montado.
O Grande Teatro pode finalmente voltar ao ar anos depois pela Nacional e o grande público de todo o Brasil conheceu peças famosas graças ao talento de Dias Gomes.
Sei de pessoas que ouviam determinada encenação e depois corriam para ler o romance.
Dias Gomes: radioteatro de qualidade nos anos 40 e 50 abriu caminho para o teatro e teledramaturgia até o final de sua brilhante carreira.

“Os Miseráveis”  “O homem que ri” “Madame Bovary”  “O retrato de Doryan Grey” A dama das camélias” “O corcunda de Notre Dame”  “O morro dos ventos uivantes”  e muitos e muitos outros títulos, pois o Grande Teatro esteve no ar por quase duas décadas.
Dias Gomes foi para a Nacional na metade dos anos 50 para escrever o Grande Teatro.

 Do casamento de 33 anos  com Janete Clair, teve uma filha, Denise Emmer que se dedicou á música.
                                               Janete Clair, Denise Emmer e o paizão Dias Gomes.                                                                                 
 JANETE CLAIR, UM DOS GÊNIOS DA RADIONOVELA
 Vou falar agora dessa figura extraordinária de novelista que foi Janete Clair.
Janete estava afastada quatro anos  da vida artística. Ela perdera o segundo filho com algumas semanas de vida por problemas de Rh. Foi aconselhada a não ter mais filhos.
Dedicou-se, então, inteiramente a Guilherme. “Fiquei inteiramente dopada de 1952 a 1956 dedicada ao lar”, citou Artur Xexéu na bela biografia de Janete que ele escreveu em 1996.
Em 1956 ela foi recebida pela rádio Nacional e  lá escreveu  36 novelas.
Me lembro dos locutores anunciarem suas primeiras novelas, que eram patrocinadas pela Sidney Ross, pelo nome de Janete Dias Gomes.
Mais tarde ela voltaria a adotar o sobrenome Clair, escolhido por Octávio Gabus Mendes, nos anos quarenta, porque ela adorava a música Clair de Lune, de Debussy.
Na verdade, o nome verdadeiro dela era Janete Emmer. 
As radionovelas de Janete já mostravam sua enorme capacidade de armar tramas, criar ganchos e montar situações que mantinham os ouvintes vidrados nos capítulos.Lembro-me muito bem de “Uma escada para o céu”  que ia ao ar às terças, quintas e sábados às 8 da noite sob o patrocínio de Melhoral.
Janete era assim quando começou no rádio.

O extraordinário sucesso das radionovelas de Janete, eram apenas o prenúncio do que ela viria realizar na telinha.
Janete nos tempos de TV Globo.

Era mais uma vez o rádio plantando o sucesso da televisão.
Mas o rádio contou também com produtores que escreviam lindos programas que usavam  elenco de radioteatro.
Vou citar alguns, pelos quais eu sempre nutri uma grande admiração e respeito, por sua criatividade e competência.


 Não poderia deixar de lembrar outro grande produtor: Lourival Marques. Era um homem de pesquisa. Possuía uma enorme biblioteca, assinava revistas, colecionava recortes de jornais, tendo para isso duas secretárias.



Durante anos escreveu um dos maiores sucessos vespertinos da Nacional: “Seu criado obrigado”. Ia ao ar às segundas, quartas e sextas às 13 e trinta. Havia um narrador:César Ladeira e uma espécie de secretária: Nilza Magrassi ou Daisy Lucidi. A  voz feminina lia cartas e  o narrador respondia. Os ouvintes perguntavam sobre tudo e “Seu criado” respondia. Isto tudo intercalado por piadas e números musicais.
Naquela época as enciclopédias eram caras, o telefone raro e não se sonhava com o Google... Por tudo isso, o rádio era o grande veículo, auxiliado pelos correios. Os ouvintes perguntam e Seu Criado, Obrigado, respondia!
Cesar Ladeira era o Seu Criado

Nilza Magrassi, a Secretária

Embora  fosse ao ar no início da tarde, havia no estúdio do 21º. Andar uma grande orquestra, e elenco de radioatores.
Quem patrocinava era Super-Flit um inseticida distribuído pela Esso.
Lourival e duas pesquisadoras  cuidavam do programa, que por sinal era o campeão de correspondência da rádio.Havia uma sala no 20 o. andar só para “Seu criado” trabalhar; Eram centenas de cartas por semana e muitas, claro, ficavam sem resposta, por absoluta falta de tempo. Porém algumas cartas que não eram respondidas no ar o eram pelo correio. Bastava mandar envelope selado e sobrescritado para a resposta. Os ouvintes perguntavam de tudo e havia os que pediam receitas de pratos típicos, poesias específicas, indicações de livros e letras de músicas em português ou outros idiomas. Outros enviavam piadas que eram transformadas em quadros rápidos interpretados pelos humoristas da emissora..
A revista Radiolândia fazia uma seleção das perguntas mais interessantes dirigidas a “Seu Criado” e as publicava quinzenalmente.
Eis um pequeno trecho de uma dessas publicações:

NILZA -  Zeneida, residente em Madureira, escreve perguntando se Carmen Cavalaro  é homem ou mulher?

CESAR-  Apesar do nome, Carmen Cavalaro é homem.

NILZA – A jovem Hilda Amaral, de Betim, Minas, escreve perguntando: que devo fazer com meu irmão? Quando bebe, fica louco, tentando o suicídio.

CESAR-   Talvez você possa ser ajudada pelos Alcoólatras Anônimos, cujo endereço é Caixa Postal 254- Rio de Janeiro. Por que não experimenta?

NILZA – Affirt Zimóles, residente na rua 25 de março, São Paulo, escreve assim:”li num livro, há poucos dias, um trecho que diz: “o animal tinha élitros negros de rara beleza”...O que é élitros?

CESAR – Élitros são asas anteriores  dos coleópteros, de coleópteros, de consistência córnea e sem nervuras.
E ia por ai afora. Alguns que tomam conhecimento dessas perguntas, hoje, podem achá-las simples, óbvias ou primárias. Mas vamos pensar num Brasil rural dos anos 50 em que muitos municípios não possuíam bibliotecas públicas, nem jornais ou revistas. O acesso ao conhecimento era precário e o rádio cumpria seu papel de informar e esclarecer. Radialistas como Lourival Marques e outros, possuíam a preocupação de informar, ensinar, sempre de forma leve, lúdica e agradável.

Como Lourival possuía um vasto arquivo com registros  sobre a vida dos principais artistas brasileiros e internacionais, a Revista Radiolândia o convidou para ser responsável por  duas colunas na revista quinzenal. Foi assim que surgiu,em abril de 1954, o Dicionário de Gente do Rádio, que organizado em ordem alfabética  se  tornou uma excelente fonte de consulta para pesquisadores que colecionaram aquele material.

Seu Criado, obrigado encontrou um seguidor no Pergunte ao João da Rádio Jornal do Brasil, que também se tornou muito popular na época, servindo até de inspiração para um samba cantado por Miltinho na década de cinqüenta e que tinha por título, justamente Pergunte ao João.O programa não tinha a sofisticação do “Seu criado”mas também cumpria muito bem sua nobre missão. Era escrito por um produtor da rádio Jornal do Brasil, chamado João Evangelista e apresentado pelo excelente locutor Jorge “Majestade” da Silva e Anita Taranto. Era diário, de 11 ao meio-dia e as perguntas e respostas eram intercaladas por uma programação musical em disco. Não havia cenas de radioteatro.

 
Mas além de Seu Criado Lourival produzia todas as 3ª.feiras às 21 e trinta um dos mais lindos programas  noturnos da Nacional: A canção da lembrança.
Era patrocinado por Phimatosan e constava de um glamoroso bate-papo entre um casal que ficava recordando músicas de filmes antigos, daí o título. O casal lembrava um filme, falava um pouco sobre ele e citava a canção que serviu de tema para o filme.
Ai vinha a música, geralmente vertida para o português com um cantor ao vivo à frente de uma grande orquestra.Lourival era dono de um invejável arquivo musical. Ele recebia da Embaixada Americana muitas fitas e discos com gravações de musicais americanos e programas de rádio da Voz da América.  Possuía também muitos livros que falavam de filmes e letras de lindas canções  em inglês.  Os arranjos eram maravilhosos, geralmente de Leo Peracchi , Ercole Vareto,Alberto Lazolli, Lírio Panicalli ou Radamés Gnatalli.  Peracchi era o autor do prefixo musical e das passagens de grande beleza.
No vibrante arranjo da abertura do programa a cargo da mini-sinfônica  da rádio, havia a participação da cantora Lenita Bruno, dona de uma linda e educada voz. Lenita era esposa de Peracchi e também cantava melodias durante o programa.
Os locutores eram Jorge Cury e Reinaldo Costa. que anunciavam :-A Canção da lembrança é um programa de Lourival Marques, para Phimatosan,  um tônico poderoso”! Era, na verdade, um dos mais lindos  programas noturnos da  Nacional, de extremo bom gosto e categoria.
Outro programa que Lourival escreveu durante muitos anos com grande brilho e bom gosto foi o Rádio Almanaque Kolynos.

Esse programa  era uma criação do genial produtor de rádio José Mauro, irmão do grande cineasta pioneiro Humberto Mauro.
Assim, deixo de falar do Lourival Marques para falar, em seguida, deste  outro produtor muito importante na história do nosso rádio que foi ...

JOSÉ MAURO,UM MITO DOS PROGRAMAS MONTADOS.A HABILIDADE DE FLORIANO  E DOS ARTISTAS ENVOLVIDOS

Vamos falar primeiro de José Mauro, um dos gênios de nosso rádio, brilhou em todas as estações de rádio por onde passou, deixando sua marca nas programações que dirigiu.
Na rádio Nacional do anos quarenta ele não deixou por menos. Entre os inúmeros programas que criou e dirigiu, cito agora o Rádio Almanaque
Nesse programa José Mauro  selecionava  um tema e o desenvolvia sob diversos aspectos, ilustrando-o com cenas de radioteatro emolduradas por  uma trilha musical,especialmente produzida, executada pela grande orquestra. Era uma trilha para cada programa. Um verdadeira obra-prima musical que pontuava as ações encaminhadas por uma narrador, tudo muito cronometricamente.
O  ensaio era duas horas antes do programa entrar no ar. O diretor musical Paulo Tapajós possuía um perfeito entrosamento com o ensaiador do programa de maneira que as falas do narrador  e a participação dos radioatores, casasse perfeitamente com o tamanho das frases musicais.
O profissionalismo dos músicos da orquestra era de alto nível. Todos professores,  liam suas partituras de “primeira”. O mesmo acontecia com os atores.
A radioatriz Isis de Oliveira conta:  nestes programas havia um ensaio no andar 22 com o diretor que geralmente era Floriano Faissal. Em seguida o elenco descia para o grande estúdio do 21 onde já estava a orquestra reunida e então era feita uma leitura com a orquestra.Acontece que nem sempre esse ensaio com a orquestra era possível se fazer. Nós atores, ficamos então atentos ao Floriano, o qual, entrosado com o maestro dava os sinais para nossas entradas, pausas ou velocidade de leitura.
Havia muito profissionalismo, tanto por parte da orquestra quanto do elenco e assim tudo saia perfeito!
Havia, portanto, a figura do maestro à frente da orquestra que dava  sinais ao ensaiador, para a entrada dos atores no momento de suas falas.
Floriano, horas antes, fazia ele, um ensaio com o maestro e marcava os tempos das músicas em seu script. Dessa maneira ele tinha condições de ir dando os sinais para os atores, que deveriam ler as falas no tempo certo da música. Era uma enorme responsabilidade que exigia do diretor ter bom ouvido, sensibilidade e segurança no momento de dar os sinais. Floriano aprendera essa técnica com Vitor Costa.
Muitas vezes, ainda menino, participei de histórias infantis para os famosos Festivais GE, nas noites de terça-feira. O maestro Leo Peracchi escrevia umas trilhas lindas que eram executadas pela sinfônica da rádio. Vitor Costa tinha um código. Mão no meu ombro. Quando apertava era para eu falar. Quando soltava eu parava, dando uma pausa, para a orquestra poder subir. E era assim. Dava tudo certo! Conta Abelardo Santos.
 Enquanto isso no controle de som, havia um  segundo maestro, que, com a partitura e o roteiro à sua frente dava ordens,  ao operador de um microfone  que se deslocava sobre uma base acima  das cabeças dos músicos. Esse microfone era chamado de girafa ou “boom”. Era uma base com rodas, onde se prendia uma haste com o outra haste em ângulo de 45 graus  de onde pendia um microfone.
A fim de captar melhor o som  dos instrumentos da orquestra, o operador do boom, sob as ordens do segundo maestro que lhe chegavam pelos       headphones, deslocava o girafa segundos antes para junto desse ou daquele instrumento ou grupo de instrumentos musicais.
Toda essa importante manobra  se processava para suprir uma deficiência das mesas de som da época.
Essas mesas só podiam receber 4 microfones.  Os técnicos descobriram que, ligando os microfones em série, se poderia obter um resultado tal, como se tivéssemos oito microfones.
O passeio do boom pelo estúdio, se aproximando dos instrumentos na hora certa, funcionava como se tivéssemos em mãos diversos microfones, evitando-se, assim, que um instrumento abafasse o outro o que produziria  um “som chapado” que os maestros odiavam..
A manobra do boom  está muito bem descrita no  excelente livro de Luis Carlos Saroldi e Sonia Virginia Moreira denominado Nas ondas da rádio Nacional onde os autores dão um título muito espirituoso ao  relato de Paulo Tapajós: “Uma girafa passeia pelo estúdio”.
Rádio Almanaque, Festivais GE, A canção da lembrança e outros programas do gênero eram gravados conforme iam ao ar, em discos de acetato de 16  polegadas. Terminado o programa toda a equipe se reunia num estúdio ocioso ou na discoteca e ouvia o programa. Era  um laboratório, uma auto-avaliação do que havia ido ao ar e se analisava técnica e artisticamente a produção, corrigindo falhas,  buscando um  aprimoramento.
Por isso a Nacional se  transformou, no decorrer dos anos, em um verdadeiro modelo, uma referência no rádio de sua época.
Uma escola de rádio.
E José Mauro era um dos mestres dessa escola.
Houve um período em que José Mauro foi para a Tupi. E levou junto seu talento, para escrever Instantes Sinfônicos, também um programa montado transmitido do auditório  com grande orquestra, coro e elenco de radioteatro do qual fazia parte a jovem adolescente contratada da Tupi, Aliomar de Matos. È ela que nos conta:
O programa ia ao ar à noite, no horário nobre.Fazíamos o ensaio e descíamos para o palco-auditório,vestindo as melhores roupas, como se fôssemos para uma festa. Lá estava a orquestra, o coro e todo o elenco. Na platéia do lindo e confortável auditório, pessoas bem vestidas e comportadas. Eu adorava participar desse programa. Tudo maravilhoso!
Quando José Mauro foi para a Tupi o Rádio Almanaque conheceu outros produtores. Em certo período Haroldo Barbosa alternava com Paulo Roberto a redação do programa. Lourival Marques o escreveu  nos anos cinquenta.

A produção do programas montados era trabalhosa, porque exigia muita pesquisa e criatividade para quem produzia e fôlego e talento para quem realizava. Mas tudo isso era o que não faltava  àqueles radialistas.
José Mauro escreveu grandes programas montados na Nacional e depois na Tupi.




O maior entre os produtores: Almirante. Certamente uma das mais importantes figuras do rádio em todos os tempos.
Escreveu programas importantes na história do rádio: “Curiosidades Musicais”o primeiro programa montado do rádio brasileiro, que estreou na rádio Nacional no dia 2 de abril de 1938.                                                                                                             “Caixa de Perguntas, foi outra ousadia de Almirante. Estreou também na Nacional no dia  5 de agosto de 1938. È considerado o primeiro programa de auditório do rádio.        E era patrocinado por um produto chamado BY-SO-DO”.  Não me perguntem para quê.  
Almirante: criador do rádio-espetáculo e dos programas montados. Aqui está apresentando sua famosa criação: Caixa de surpresas, nos anos 30.


Mas a grande criação da “maior patente do rádio brasileiro” como era chamado Almirante foi  o “Incrível, Fantástico, Extraordinário.
Almirante usava todos os recursos do rádio da época para produzir seus programas.
Tinha uma boa voz, narrava seus textos com muita emoção e autenticidade.                    O “Incrível” como se chamava comumente na época era um dos meus preferidos.

Lançado na Tupi em 1947  com grande divulgação na época, o programa radiofonizava cartas de ouvintes que narravam fatos sobrenaturais.E Almirante  fazia questão de que essas cartas contivessem referências de testemunhas de pessoas que haviam também testemunhado o acontecido. Se não era fornecido no ar o endereço completo das testemunhas, por motivos óbvios, eram  dados detalhes que faziam crer que o fenômeno tinha realmente acontecido com aquelas pessoas.
Almirante abria o programa com uma pergunta desafiadora:
Você não acredita no sobrenatural? Então ouça !
E três vozes  exclamavam, intercaladas por acordes da orquestra:

Incrível ! (ACORDE)
Fantástico!(ACORDE)
Extraordinário! (ACORDE FINAL)

O  “Incrível” contava com elenco de radioteatro,efeitos sonoros e grande orquestra.
Almirante conduzia o programa e a narrativa  podia ser feita  na primeira ou na  terceira pessoa, com a entrada das dramatizações pontuadas por efeitos sonoros e  uma trilha musical executada pela orquestra acompanhando a ação.
O patrocínio era de “Guaraína, um remédio que não ataca o coração”.
A contra-regra poderia ser de Barros Barreto ou de  Orlando Drumond. Os arranjos e a orquestra eram da responsabilidade de Aldo Taranto e Morfeu,  dois dos mais famosos maestros da Tupi naqueles anos 40.
Maestro Aldo Taranto  um dos responsáveis pelos arranjos do Incrível...
Castro Gonzaga era radioator do Incrível...

Maria do Carmo: radioatriz versátil atuava  no drama e na comédia.


Ida Gomes, radioatriz da Tupi,depois foi para televisão.

                                                    
                                                         Paulo Porto, radioator brilhante:
                                                    dirigia o Incrível, Fantástico, Extraordinário.
Ia tudo ao vivo, às terças-feiras às 21 e trinta. O programa era feito do palco-auditório  que seria destruído pelo incêndio de  1949.
Não havia público. Um vigia trancava a porta de acesso à platéia, fechavam-se as cortinas prateadas e o palco se convertia num imenso estúdio que abrigava locutores, atores e orquestra. Algum material de contra-regra era levado para lá, conforme exigência do script. Muito usadas eram as correntes que se arrastavam  sobre  uma taboa, uma porta que rangia, um tanque com água, vidraças que eram quebradas, coisas assim.
Relata-me a radioatriz Aliomar de Matos, (que quando do lançamento do Incrível tinha apenas 16 anos), que depois o programa passou a contar com a presença do público, que bem comportado, não se manifestava, assistindo em silêncio à performance dos atores no palco-estúdio.
Estes eram os mesmos que faziam as novelas ou os programas humorísticos durante o dia. Cito apenas alguns deles: Paulo Porto,Paulo Gracindo,Castro Gonzaga, Amélia Simone, Germano, Ida Gomes, Restier Junior, Edelzia dos Santos, Leda Maria, Luiza Nazareth, Paulo Raimundo, Hamilton Ferreira, Duarte de Moraes, Thelmo de Avelar, Antonio Leite, Luiza Nazareth, Nair Amorim, Aliomar de Matos e tantos outros de  grande talento.
O locutor, na maioria das vezes, era o excelente Osvaldo Luís,
Eu costumava ficar acordado, escondido de meus pais, é claro, junto ao grande rádio da sala de jantar da fazenda dos Arcos, volume no mínimo, ouvido colado no alto-falante.
Morria de medo com as horripilantes  histórias, mas o prazer de ouvi-las superava o pavor. Numa noite ouvi uma dessas histórias, numa casa na zona rural, os moradores foram acordados com os cães em alvoroço. Ao chegar à janela que dava para o quintal da casa, viram um estranho animal  de patas muito curtas que se arrastava com dificuldade pelo terreiro. A noite não era muito escura e dava para ver os cachorros tentando se aproximar, mas sendo rechaçados por aquela criatura bizarra.
-Quando as luzes do quintal foram acesas, narra Almirante,os moradores da casa viram uma coisa medonha, o rosto da criatura era de Francisco Osório, um agiota, muito mal visto na região, que duas semanas antes fora barbaramente assassinado por um de seus credores.
-Foi quando, aquela criatura, soltando um  som, misto de grunhido e voz humana  disse algo que deixou todos petrificados,   segue Almirante.
-Que Deus me perdoe... que Deus me ajude ... Rezem por mim ! Rezem por mim!.

E a orquestra atacou com um acorde dramático  e patético.
Bem, não preciso dizer que morri de medo e voltei pé ante pé para minha cama ao término do programa.
Mal havia pego no sono e eis que os cachorros que guardavam a fazenda começaram a latir sem parar.
Meu pai  e meu  avô se levantaram e foram até a janela que dava para o terreiro onde os cães se encontravam.
Pulei da cama e fui junto. Eu guardava ainda na memória a história que  havia  rolado no programa de rádio.
Eu tinha nessa época uns nove anos de idade e meu pai me deixou olhar pela veneziana da janela ao lado.
Os animais latiam furiosamente e tentavam atacar um outro  do porte deles . Parecia um outro cão  que se espremia  conta a parede da casa. De quando em vez ele investia valentemente contra os cachorros de tal maneira que estes, embora fossem três não ousavam se aproximar.
Eu estava petrificado com aquela cena, pois era inevitável que eu não estabelecesse uma analogia com o que ouvira no rádio uma hora antes.
Finalmente o animal conseguiu escapar em meio a matilha. Foi então que meu pai e meu avô viram  que se tratava de um cachorro do mato, ou lobo-guará, que naquela época ainda encontrava habitat nas matas da região. Suas longas pernas e focinho comprido não deixavam margem a  dúvidas. Saiu em louca disparada, deixou os pastores para trás.
Excitadíssimo, voltei para a cama, custei a pegar no sono, mas nunca deixei de ficar com o ouvido colado na Tupi, às terças-feiras às 21 e trinta.
-Você não acredita no sobrenatural?
Então ouça !
E eu não deixava de ouvir.

Almirante foi um radialista extraordinário.
Segundo Luiz Carlos Saroldi ele compõe com Edgard Roquette-Pinto e Ademar Casé, o tripé perfeito, no qual se apoiou o rádio no Brasil.
O primeiro por sua visão empreendedora ao fundar a primeira emissora de rádio e Casé por ter criado as raízes do rádio comercial, possibilitando a profissionalização dos artistas ao deixar de vender aparelhos de rádio para vender anúncios para o rádio.
Pois Almirante pensava em rádio 24 horas por dia.

 Sérgio Cabral, em seu excelente livro No tempo de Almirante,  nos conta:

O incêndio da rádio Tupi destruiu, entre outras coisas  um saxofone de Pixinguinha e uma invenção  de Almirante que já havia sido introduzida na Nacional e que estava em pleno funcionamento na Tupi: era o “Procurol” um dispositivo que permitia a todo funcionário atender o telefone, em qualquer dependência da emissora.
Almirante espalhou pela casa uns quadros que projetavam números correspondentes a cada  funcionário. A telefonista  atendia o telefone e imediatamente disparava o número chamado e todos os quadros se acendiam com aquele número.

Era isso mesmo! Evidentemente que somente os funcionários mais graduados ou da diretoria é que estavam incluídos nesse esquema. Ao ver seu código no painel, bastava ir ao telefone mais  próximo e atender.
Este sistema também, mais tarde foi implantado na Nacional.
Quando cheguei,em setembro de 1952 o sistema funcionava perfeitamente e era uma solução para aqueles tempos em que não havia celular.
Foto feita na Rádio Nacional  em 1941: Almirante, Rose Lee, maestro Romeu Ghipsman,Celso Guimarães e Roxane

EURICO SILVA TRADUZIU E ADAPTOU PARA O BRASIL, O DIRETO DE NASCER!


Nascido em Portugal, Eurico Silva chegou à Nacional com 39 anos de idade vindo do teatro, quando a emissora tinha apenas 3 anos de fundada.
Era um senhor extremamente educado, polido, discreto, de poucas palavras. Tive ocasião de ser dirigido por ele, em várias oportunidades, no Clube Juvenil Toddy. A elegância dos gestos era também presente no modo de se vestir. Integrou-se plenamente no rádio e além de novelista e produtor, traduzia obras e as adaptava. Foi o que aconteceu com O direto de nascer foi uma adaptação sua da novela cubana de Félix Caignet . Escreveu outras novelas de sucesso  mas se destacou também por seu grande poder de síntese,  ao adaptar operetas famosas que eram levadas ao ar a cargo do elenco de radioteatro da Nacional. Nesta série de programas havia a figura de um casal expectador, interpretado por Floriano Faissal e Simone Morais o qual ia elucidando e explicando o enredo das operetas  ao ouvinte.  Dentro  desse formato, o grande público pode conhecer operetas famosas como  Viúva alegre,  Sonho de Valsa, Paganini, Rosemarie, Casa das três meninas, Amores de príncipe, Primavera, Conde de Luxemburgo,Balalaika e muitas outras.  Escreveu também No tabuleiro da baiana e Você faz o programa. Neste último, como diz o título, os ouvintes participavam ativamente, mandando histórias ou textos que Eurico adaptava e eram colocados no ar. Os  ouvintes que tivessem seus trabalhos aproveitados recebiam o polpudo prêmio de 100 cruzeiros, um dinheirinho bom no final dos anos 40.


Material de divulgação da novela que mais fez sucesso no rádio brasileiro no início dos anos 50.

Nos anos 60 a novela migrou para a televisão. A jovem freira Helena da Caridade foi interpretada pela hoje veterana Nathalia Timberg.
Quando terminou a versão da novela para a televisão em 1965
 houve uma festa com a participação de todo elenco a caráter.


Floriano Faissal e Eurico Silva, ambos de branco,   
dirigem um ensaio de novela nos anos 50 na Nacional


. 

Eis outro português que fez sucesso  no velho rádio. Chegou ao Brasil com apenas 7 anos de idade. Em 1937, quando o radioteatro ainda engatinhava, Soveral escreveu um seriado para a Rádio Tupi: As aventuras de Lewis Durban. Era uma novela de mistério com capítulos semanais, pois a estrutura incipiente do rádioteatro da época não permitia mais do que isso. Chamo a atenção para o fato de que, neste período, Os estúdios pioneiros da  Tupi ficavam  instalados num galpão na rua  Santo Cristo. Como já nos referimos no início deste livro, foi dessas instalações que se transmitiu a primeira radionovela. Os atores que participavam de  As aventuras de Lewis Durban, eram praticamente os mesmos que atuaram na pioneira Mulheres de Bronze sob a direção de Olavo de Barros.Soveral, embora muito jovem,  possuía um raro talento para escrever . Era algo como que instintivo. Autodidata,  nunca havia cursado nada além do que  o ensino médio.Porém, inteligente e observador espelhava-se no exemplo de outros escritores. Tanto assim que viajou para São Paulo e passou a escrever novelas para a Rádio São Paulo, cujo radioteatro era dirigido pelo mestre Oduvaldo Viana.
Quando em 1943 voltou ao Rio, o jovem Hélio,  trazia, junto com a bagagem, uma enorme experiência.
È importante se dizer aqui, que ele foi um dos pioneiros das novelas musicadas e cantadas e isso ainda nos anos 40. Uma dessas novelas foi Meu amor que tinha a cantora Dircinha Batista fazendo o papel de uma cigana.  Outra foi Pequetita, tendo Mildred dos Santos no papel título. Na vida real o apelido de Mildred era Pequetita, uma vez que sua irmã não sabia pronunciar o nome verdadeiro. Soveral criou  a personagem que Mildred interpretou com muito brilho. O galã era Paulo Gracindo e a mulher fatal Alba Regina, uma estrela na época. À medida que Mildred foi aparecendo na novela a personagem título ganhou tanta força que abafou a mulher fatal. Ela fazia uma moça ingênua que conquistou os ouvintes. Geraldo Mendonça e o autor da novela compuseram uma linda valsa cujo título era o nome da novela. Pequetita vendeu milhares de discos em poucas semanas.   Outros números musicais ficavam a cargo de Carlos Galhardo, interpretando músicas  compostas por Geraldo Mendonça.

De pé: o contra regra Etéreo Lemos e Hélio do Soveral organizam uma cena de radionovela anos 50

Continuando a falar de Soveral,em 1958 ele foi  para a Nacional quando lançou  o famoso Teatro de Mistério, peças completas semanais nas quais o mistério era desvendado pelo famoso Inspetor Marques, vivido inicialmente por Rodolfo Maier e depois por Domício Costa. Escrevia novelas, seriados, programas humorísticos e roteiros para cinema. Muitas das chanchadas da Atlântida Cinematográfica dos anos 40 e 50 tiveram sua assinatura. Assim, no mesmo período em que escrevia o Teatro de Mistério, produzia também o Programa César de Alencar. Isto entre 1950 e 1964.
Um produtor  pioneiro do radioteatro. Um  produtor eclético.

5 comentários:

  1. Sensacional! A Rádio Nacional marcou minha infância e adolescência, com seus extraordinários programas. Eu era um assíduo ouvinte do Grande Teatro Orniex.

    ResponderExcluir
  2. Maravilhoso esse texto! É ótimo estudo para o admiradores da era do Rádio. Passei a minha infância ouvinte vários dos programas citados.
    Quanto ao Grande Teatro Orniex, eu gostaria de saber em que data o texto da peça O Gosto da Vida de Maria Jacintha foi ao ar. A data do texto original é de 12 de junho de 1972.

    ResponderExcluir
  3. O primeiro patrocinador foi Soutien DeMILLUS em 1954. Era o Grande Teatro DeMillus. Depois mudou para os produtos Orniex, ainda nos anos 50. Saiu do ar nos anos 60. Se o texto original é de 1972, não aconteceu no Grande Teatro. São os registros que possuo. Obrigado pelo comentário!

    ResponderExcluir
  4. PROFESSOR ROBERTO SALVADOR,SEU ESPAÇO CORDIAL QUE USEI VARIAS VEZES, COM TODA CERTEZA ME TROUXE NO YOUTUBE, ONDE TENHO O CANAL RADIALISTA ZAIR CANSADO,COM MUITOS VIDEOS DE BANDAS DE MÚSICA,AS ATENÇÕES DE MILHARES DE CRIATURAS.SOU=LHE PROFUNDAMENTE AGRADECIDO , SOU DO TIME DOS ANTIGOS RADIALISTAS ACUMULANDO EXPERIENCIAS NO RADEO E NA INTERNETE HONRADO TAMBEM POR FIGURAR NA WIKIPEDIA E NO ESPAÇO DO GRANDE RICARDO CRAVO ALBIM.DEUS O ABENÇOE SEMPRE.

    ResponderExcluir
  5. Fico muito feliz com tuas palavras Zair. Sempre apreciei teu trabalho em defesa das bandas de música e fazer de seu programa de rádio um baluarte em defesa das bandas de música. Grande abraço!

    ResponderExcluir