domingo, 2 de agosto de 2020

OS MÉDICOS DO RÁDIO- PARTE 2

Roberto Salvador.

Vamos conhecer, a seguir mais três médicos, que apaixonados pelo Rádio nos encantaram com seu talento e criatividade.

PAULO ROBERTO, CRIADOR DA EXPRESSÃO AMIGOS OUVINTES

                  Estúdio de radioteatro: No ar... Obrigado,doutor


Paulo Roberto.
Uma das figuras mais queridas do nosso Rádio

O médico e radialista José Marques Gomes (o nome de batismo de Paulo Roberto), nasceu em 10 de outubro de 1903,na localidade mineira  que se chamava Saúde,depois rebatizada   de Dom Silvério.
 Formou-se pela Faculdade Nacional de Medicina

Após  clinicar no interior de Minas Gerais, volta ao Rio de Janeiro e  nos anos trinta é atraído por algo que começava a surgir em todo o país espalhando-se como uma epidemia. Não como aquelas com as quais ele estava acostumado a lidar,  naturalmente...Tratava-se do Rádio, que iniciava sua trajetória, para  se transformar, em pouco, no maior fenômeno da comunicação em todos os tempos.

Anúncio que circulava pelo Rio de Janeiro.
O Programa Casé profissionalizou o Rádio, divulgando anúncios e pagando os artistas.
Adhemar Casé
 lançou o jovem médico Paulo Roberto no Rádio.

Levado pela curiosidade, foi trabalhar no Programa Casé, produzido por Adhemar Casé  na extinta Rádio Philips. Era um programa pioneiro no rádio brasileiro que buscava uma nova linguagem e que reunia o que havia de melhor entre  os profissionais de então. De imediato Dr. José Marques, muito jovem na época, influenciado por amigos teve uma preocupação: o que diriam seus clientes se soubessem  que ele estava metido no meio de sambistas, músicos e boêmios.A solução veio de sua mente criativa: no Rádio ele seria Paulo Roberto em  homenagem ao seu primeiro filho, Roberto. Assim ninguém precisaria saber que ali estava o respeitável Dr. José Marques.Paulo Roberto era redator do programa. Seus textos se revelaram admiráveis, lidos por “speakers” da época buscavam uma linguagem nova, leve, direta, criativa.Um dia falta o locutor e Casé ordena-lhe: “Entra você no lugar de quem faltou”! Sua voz  simpática, agradável, levemente anasalada e natural, era um contraste com o tom empostado da época. O sucesso foi duplo. Textos inteligentes lidos de forma  terna e coloquial.Aos poucos  seus clientes foram descobrindo a “dupla identidade” e não faltavam elogios.

Mas o médico prosseguia. Especializou-se em Obstetrícia e entrou para a Prefeitura indo trabalhar na Maternidade de Cascadura, onde permaneceu até aposentar-se. Segundo palavras suas “amparando mais de 1.500 barrigudinhos do sertão e milhares de enfezadinhos dos morros cariocas”

Paulo Roberto na Maternidade de Cascadura:
"amparei milhares de enfezadinhos cariocas"

O radialista e o médico trabalhavam juntos. O tom humano que conduzia seus plantões era o mesmo que norteava os programas de rádio que produzia, as poesias que criava, as músicas que compunha.

Elizeth Cardoso  em "Cantando pelos caminhos".
Rádio Nacional,Quintas-feiras 21 e 30.
Na Rádio Nacional em 1947 ao criar o  programa Nada Além de Dois Minutos, foi reconhecido como introdutor do “timing” no rádio brasileiro. Pioneiramente    apoiou         o     surgimento                   dos  “Alcoólicos Anônimos” e  de outras campanhas beneméritas e de profundo conteúdo social.

                                     No ar ... Nada além de dois minutos!:

                  domingos 21 horas. Orquestra e elenco de Radioteatro.

Sua voz e sua inteligência atingiram todo o Brasil através de programas  da mais alta qualidade.     Quem  tiver mais de 60 anos vai se lembrar: Bandeiras da Liberdade,   Gente que brilha,     Nada além de dois minutos,    Alô Brasil,    Cantando pelos caminhos, Honra ao Mérito, A Lira de Xopotó,Vamos viver a vida (crônica diária) e aquele em que ele mesmo interpretava o papel de médico e que era apreciado por milhares de ouvinte: Obrigado, Doutor. A cada terça-feira os ouvintes que o desejassem escreviam para a Nacional indicando seu médico para ser homenageado. O locutor anunciava seu nome e o médico recebia “uma caneta Parker 51 oferecimento do Leite de Magnésia de Philips”.  Seguia-se então uma história  interpretada pelo elenco de radioteatro,  narrada pelo próprio Paulo Roberto  e carregada de emoção e sentido humano. Foram 314 contos radiofônicos, trágicos ou divertidos.
Paulo Roberto,
 médico e radialista no inicio de sua carreira

Demitido da Nacional pelo Movimento Militar de 1964, foi um dos primeiros apresentadores da TV Globo, ao conduzir o programa Câmera Indiscreta e nos anos 70 atuou no Projeto Minerva da Rádio MEC.Paulo Roberto  sabia que o rádio devia ser o grande instrumento de integração nacional, pois seus programas tinham a preocupação de mostrar ao homem do interior  mais amor ao seu lugar, á natureza que o cercava.Este mineiro da Zona  da Mata estava certo. Deixou sua marca como profissional e como ser humano.

E só para  fechar este   estudo sobre Paulo Roberto, uma curiosidade que poucos conhecem: ele é o autor da expressão “amigos ouvintes”, muito utilizada no velho rádio e que, atravessando gerações, está presente no rádio atual.

Grande Paulo  Roberto !

Obrigado, doutor !

ALDIR BLANC 

Era  formado pela Escola de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, que hoje faz parte da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, com especialização em Psiquiatria. Sempre acreditou na arte. Inclusive, chegou a colocá-la  a serviço de seus pacientes do Hospital Psiquiátrico do Engenho de Dentro, Zona Norte do Rio de Janeiro. 

Aldir Blanc: terapia pioneira através da arte  

 Abandonou a profissão para se tornar compositor e um dos grandes letristas da história da música brasileira. Em 50 anos de atividade, foi autor de mais de 600 canções, com cerca de 50 parceiros, dentre os principais: João Bosco, Guinga, Moacyr Luz, Cristóvão Bastos, Maurício Tapajós e Carlos Lyra. Entre seus trabalhos mais notáveis como compositor estão “Bala com Bala”, “O Mestre-sala dos Mares”, “Dois pra Lá, Dois pra Cá”, “De Frente pro Crime”, “Kid Cavaquinho” e  outras .
O lado do artista acabou superando a carreira do médico

Aldir, embora  não tenha sido um radialista, propriamente dito,  o incluo aqui  pois confessou em entrevistas  que era um amante, profundo admirador do velho rádio e ouvinte assíduo dos programas da Rádio  Mayrink Veiga.Declarou que o rádio influenciou muito sua vida.  Tanto assim que em uma de suas composições, Linha de Passe cita a emissora e um de seus famosos programas noturnos: Val da Valsa. Eis aqui um trechinho da letra, com  música  de  João Bosco.

...E o meu café, cadê? Não tem, vai pão com pão

Já era Tirolesa, o Garrincha, a Galeria

A Mayrink Veiga, o Vai-da-Valsa, e hoje em dia

Rola a bola, é sola, esfola, cola, é pau a pau

E lá vem Portela que nem Marquês de Pombal ...

O menino Aldir gostava de ouvir Rádio

LUIZ JATOBÁ, UM MÉDICO ORTOPEDISTA QUE SE TRANSFORMARIA NO  LOCUTOR COM A VOZ MAIS BONITA QUE O RÁDIO  CONHECEU.

Tudo começou graças à influência de uma namorada. O jovem Jatobá cursava Medicina no Rio de Janeiro. Em 1935 a recém    inaugurada Rádio Jornal do Brasil abriu concurso para locutores e a moça o incentivou a inscrever-se. Embora ser locutor de rádio não estivesse nos seus planos, foi aprovado e imediatamente contratado, começou a fazer programas de música clássica no horário noturno. Ele gostou da coisa e os ouvintes também. O locutor de voz bonita se despediu da Rádio JB e formado, foi fazer uma pós-graduação nos Estados Unidos. Mas estava escrito nas estrelas que o médico ortopedista acabaria se tornando um grande radialista. Foi um dos primeiros locutores da Voz do Brasil e em 1940 foi contratado pela Columbia Broadcasting System, CBS e partiu para Nova York de onde lia notícias da Segunda Guerra Mundial para o Brasil, ao mesmo tempo em que narrava documentários e trailers para a  Metro Goldwin Mayer. Sua voz era então famosa no Brasil, mas seu rosto só ficou conhecido quando voltou ao seu país para apresentar o primeiro noticiário da TV Tupi no Rio de Janeiro. Em 1951 apresentava programas  noturnos da Rádio Mayrink Veiga, inclusive o Vai da Valsa, aquele escrito por Haroldo Barbosa  e que era o favorito do então garoto Aldir Blanc. Esteve na Nacional e depois foi para a televisão, atuando na Excelsior e Globo. Voltou aos Estados Unidos atuando na Columbia, Paramount e Universal, sempre narrando filmes, documentários e traillers.


Dr. Moysés Roiter: 
opção pela Pediatria preocupado com as  crianças carentes dos morros cariocas 

Vamos falar de uma personalidade muito especial. Médico famoso no Rio de Janeiro e radialista anônimo  de bastidores, pelo histórico que revelamos a seguir Nasceu na Ucrânia. Chegando  ao Brasil com a família, quando tinha apenas  5 anos, naturalizou-se brasileiro em 1945, quando se formou  em medicina. Tornou-se  um dos mais conceituados pediatras que o Rio conheceu. Muito jovem, atendia crianças nos morros do Borel, Formiga e Salgueiro, Zona Norte do Rio de Janeiro. Trabalhava 12 horas por dia, muitas vezes sem  remuneração.  Mas, a paixão do médico  pelo  rádio se daria a partir do inicio dos anos 50, quando casado com a radialista  Maria de Lourdes Alves Roiter passou a auxiliá-la na produção dos programas que ela dirigia nas rádios Mayrink Veiga, Nacional e Roquette-Pinto. Na produção do Clube Juvenil Toddy, Programa dos Estudantes, Bandeirantes do Ar e O Estudante e a Música, o médico   se revelaria extremamente criativo e dono de um texto impecável. Ajudava a professora Maria de Lourdes na elaboração dos roteiros dos programas que alcançaram muito sucesso na época. Além disso, nos bastidores, orientava os jovens que  participavam dos programas, exigindo-lhes   e cobrando-lhes qualidade com  bastante rigor. O resultado é que daqueles programas despontaram cidadãos. De  tal forma que, mesmo aqueles  que não seguiram a carreira radiofônica, se destacaram em outras atividades profissionais.


                     Professora Maria de Lourdes Alves Roiter:

         destaque na produção de programas para jovens talentos.


Narrador esportivo José Carlos Araújo e o autor do Blog. Oriundos dos programas da professora Maria de Lourdes Alves Roiter. Um comprou o livro do outro

Trio Esperança nos anos 50:
surgimento no Clube Juvenil Toddy e Bandeirantes do Ar.


Golden Boys nos anos 50:
 membros da família do Trio Esperança, também lançados nos mesmos programas.
Programa dos Estudantes em 1961 no estúdio de radioteatro da Nacional. Francisco Nunes, Roberto Salvador,não identificado,professora Lourdes, Zilda De Paula Ribeiro,Renato Matos e Edson Schetini de Aguiar

Pietro Mario, o Capitão Furacão na TV Globo:
 início no Clube Juvenil Toddy
Dinoel Sant'Anna:
 inicio no Programa dos Estudantes, carreira brilhante no rádio e tevês cariocas.

 

Roberto Salvador, José Carlos Araujo e Dinoel Sant'Anna:
início comum nos programas da professora Lourdes.

José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni. 
"O primeiro salário que recebi na vida foi como redator do Clube Juvenil Toddy".

Moysés Roiter e o autor do Blog em 1998

Apesar  de sua paixão pelo rádio a carreira do médico  pediatra seguia paralela: uma imensa clientela particular com consultório  na Tijuca e depois no Leblon.  Foi  Membro  da Academia Americana de Pediatria  e  coordenou por muitos anos  os cursos Problemas da Criança e A Gestante e o Recém-Nascido, no jornal O Globo. Em 1973, recebeu o título de Carioca Honorário, um reconhecimento a quem tanto havia feito pelas crianças dessa cidade.

O fôlego de campeão de nado-livre pelo  Tijuca Tênis Clube lhe permitia tantas atividades. Contudo ele fazia uma exigência: seu nome não podia constar dos créditos e sua voz jamais foi  para o ar.Nem nas fotos queria aparecer. Contudo, todos os que trabalhavam nos bastidores e até membros  da direção das emissoras, sabiam da importância de sua participação, embora anônima. 

O autor do Blog e Roiter: carinho de longa amizade

E então, gostaram desta postagem? 
Mandem seus comentários! Nosso objetivo é preservar a memória do velho Rádio!


Quer saber mais sobre a História do Rádio? Leia nosso livro.





Até a próxima!




13 comentários:

  1. Adorei! Muitíssimo interessante! Parabéns!

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  2. Amigo,Roberto!
    Sensacional sua postagem,tanto destaco a parte 1 como a parte 2. Parabéns,pela sua grande dedicação,a história do rádio, que aliá, conheço através do seu interessante livro "A era do "Rádioteatro"! Parabéns por nos apresentar seus amigos "médicos e radialistas"!

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    1. Fico feliz e incentivado a seguir com esse meu trabalho de preservação da memória do velho rádio. Muito e muito obrigado!

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    2. Muito e muito agradecido por seu comentário. Siga conosco!

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  3. Parabéns, Roberto.
    É o passado que ressuscita nas imagens que desencadeiam.
    É alegria e é prova da verdade então revivida.

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    1. Pelo texto ouso identificar a autora desse lindo comentário! Um beijo querida amiga!

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  4. Ah... Roberto, o que dizer um filho do Dr. Moyses? Apenas aplaudir tua carinhosa lembrança. A Profa. e ele te admiravam muito. Marcio Roiter

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  5. Querido amigo Márcio Roiter, com emoção recebo teu comentário! O casal foi muito importante na minha vida.

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  6. Roberto, que trabalho lindo! Realmente uma viagem no tempo, cheia de empenho e carinho. Parabéns e obrigada por isso! Destaco especialmente a história do Dr. Moysés Roiter. Sou arquiteta e estive no antigo consultório onde ele atendia na Tijuca na semana passada e adoraria compartilhar um texto que fiz sobre o espaço, e um pouco da história dele e do médico que ali atuou em seguida. Como posso te enviar?

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  7. Olá Nina Zonis. Que alegria receber esse teu comentário tão importante para mim. Gostaria, sim de conhecer esse texto. Ai vai meu WhatsApp: 21-999124202. Não deixe de fazer contato.

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