sábado, 13 de agosto de 2016

HUMOR RADIOFÔNICO: O RÁDIO COMEÇA A FAZER RIR.

OS PRIMÓRDIOS DO HUMOR RADIOFÔNICO

As raízes do humor estão nos primeiros tempos do rádio, quando da encenação de esquetes rápidos, reunindo de dois  a três atores e sempre com um final engraçado.Muitos esquetes eram como que anedotas radiofonizadas. Era uma maneira inteligente e chamar a atenção do público para uma nova forma de interpretar, fugindo à linguagem teatral.
Nos anos trinta já havia programas que exploravam o humor compondo quadros que se alternavam com números musicais. Era o cerne dos programas montados, que surgiram mais tarde graças à criatividade do produtor  Almirante.



Almirante

Maio de 1938:
Alziro Zarur escrevia sobre rádio na revista Fon-Fon



Zarur, escrevia sobre rádio...



... depois se tornaria um grande radialista.

Começaram a surgir redatores de programas humorísticos. A revista “Fon-Fon”, famosa publicação dos anos trinta  possuía uma seção  de página inteira, assinada por Alziro Zarur, destacado radialista que se tornaria mais tarde o presidente da Legião da Boa Vontade. A seção se intitulava PR-1 Fon-Fon e na página 27 do número publicado em 7 de maio de 1938 se podia ler:
Lauro Borges na PRE-8
A Rádio Nacional ganhou um elemento de primeiro plano em matéria de humorismo radiophonico: Lauro Borges, o “az” da “Hora Sertaneja” e da  “Hora Só ...rindo” da Transmissora, que agora apresenta  “A Buzina”, seu impagável jornal falado, no Programma Palmolive”, uma das boas coisas da PRE-8.

"A Buzina", revista humorística através do rádio, precedeu uma rádio estranha:
PRK 20, depois PRK-30.(Capa do livro de P.Perdigão)

O Programa Casé apresentava esquetes engraçados:
 cerne dos grandes programas humorísticos que viriam.


Lauro Borges: 
gênio do humor radiofônico

Lauro Borges, 8 anos mais tarde estrearia na Nacional, juntamente com Castro Barbosa, um dos maiores programas humorísticos do rádio: A PRK-30. 

Mas voltemos à revista Fon-Fon.Também na mesma página, ainda na seção do Zarur:

Almirante na PRE-8, está irradiando as suas famosas “Curiosidades Musicaes”, programas de meia-hora magnificamente ensaiados e  realizados com uma apresentação humorística notável. Sem exaggero, póde-se dizer: as “curiosidades musicaes” de Almirante constituem uma verdadeira sensação no “broadcasting” brasileiro.

Estamos no final dos anos trinta e início da década de 1940.
Um dos programas humorísticos pioneiros do rádio era escrito por Renato Murce e se chamou  “Piadas do manduca”. Era uma escolinha de adultos e crianças . Ficou no ar durante 25 anos, obtendo os primeiros lugares junto ao Ibope. Ia ao ar aos domingos às 8 e meia da noite, perante o auditório lotado da Nacional. Mas antes de se chamar “Piadas do Manduca” o programa se intitulava  “Cenas Escolares” e teve muitos problemas com a censura do Estado Novo de Getúlio Vargas.
Atores de Piadas do Manduca: 
Renato Murce, Lauro Borges,atriz não identificada, Castro Barbosa e Brandão Filho.
Você identifica a atriz? Poderia ser Alda Verona ou Anamaria,a dona Teteca? Me conta.

PRK 30 no ar! 

A dupla fazia dezenas de vozes e produzia, sozinha, um programa de 25 minutos.


Grande patrocinador de PRK 30
 por várias emissoras em que a dupla atuou.


Perfumaria Myrta S.A.
Outro grande anunciante da PRK 30,
 que depois patrocinaria o Balança...

Transcrevo, a seguir, trecho do excelente livro de Renato Murce “Bastidores do Rádio, já esgotado e que é um excelente documento. Murce, uma das glórias do rádio brasileiro, escreveu:

As “Cenas Cariocas” representavam uma escola “bagunçada”. A professora Dona Teteca (Anamaria) sofria horrores com a indisciplina e as travessuras dos alunos: Manduca (Lauro Borges) Fedoca e Teleco, além do Coronel Fagundes (Juvenal Fontes) e  Seu Ferramenta (Castro Barbosa). Aderiam às aulas no desejo de “aprender” alguma coisa.
O programa era o mais hilariante possível. Provocou uma onda  enorme entre os ouvintes. A maioria gostava. Uma minoria, onde se  incluíam as verdadeiras “Tetecas”, sem força moral junto a seus alunos, deu de protestar. Dirigiram-se à Associação dos Pais de Família. Pediam sua intervenção para a retirada do programa do ar. Foram ao DIP. No dia seguinte, recebíamos aviso de que “Cenas Escolares” estavam proibidas. Obedecemos. Comunicamos, pelo microfone, o fato aos nossos ouvintes. Recebemos mais de mil cartas e telegramas. Além de inúmeros telefonemas de protesto.
Vários jornalistas escreveram sobre o assunto: Paulo Roberto, Orestes Barbosa, Caio César Pinheiro e J. Caribe  da Rocha. Todos defendiam o programa. Diziam que era até educativo. Às respostas estapafúrdias e disparatadas, seguia-se a necessária  correção e a explicação daquilo que fora argüido.

Renato Murce prossegue  seu relato, dizendo que não desanimou e  conhecendo bem a burrice do DIP, como ele mesmo escreveu, teve uma ideia que acabou passando pela censura. A ação não se passaria mais numa escola pública e sim na casa de uma professora aposentada. Na primeira metade do programa acontecia um alegre bate-papo pontilhado de piadas e situações engraçadas. Após o intervalo comercial, começa a “aula” propriamente dita. O programa passou a chamar-se “Piadas do Manduca”. Manduca era um menino sapeca e muito esperto que com tiradas hilariantes. Coronel Fagundes, na Nacional era interpretado por Brandão Filho. Chegado do interior, provocava risos com suas atitudes ora ingênuas, ora cheias da conhecida malícia mineira. Seu  Ferramenta era um imigrante português, claro, torcedor do Vasco, que levava Dona Teteca ao desespero com suas perguntas  ingênuas e engraçadas. Havia o doutor Leão, marido de Teteca. Doutor Leão era vivido pelo produtor do programa Renato Murce. Ele ajudava a esposa a esclarecer dúvidas e procurava manter o controle da situação quando a disciplina degringolava. Era sofisticado no falar, possuía vasto conhecimento, ensinava coisas úteis, mas ficava encalacrado quando o demônio Manduca se referia  “a uma certa francesa”. Mais tarde outros personagens foram incorporados, como um imigrante turco, Seu  Nagib , interpretado por Alfredo Viviani e outros que eventualmente iam visitar Dona Teteca.
O programa sempre se encerrava com uma boa piada de efeito que levava o auditório às gargalhadas fundindo-se ao sufixo, especialmente produzido e executado pelo conjunto regional de Dante Santoro.

EM PLENA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL, ABRE-SE UMA TRINCHEIRA DE HUMOR PARA COMBATER O NAZI-FASCISMO.

Hitler...


Mussolini...


General Tojo...
 O histrionismo dos três era um prato cheio para o humor de Renato Murce


Estamos em agosto de 1942. Eis que  Renato Murce tem uma ideia criativa  que lhe rendeu imensa popularidade e respeito. Baseado  na peça de Júlio Dantas, A Ceia dos Cardeais, Murce escreveu a série O rega-bofe dos Vândalos, ridicularizando, a partir do humor, Hitler,Mussolini e Tojo, o primeiro-ministro japonês.
Transmitido na época em que nossos pracinhas lutavam na Itália, o sucesso de público foi estrondoso. Várias emissoras em todo o país solicitavam a retransmissão  e Murce passou a escrever uns folhetos com as histórias do programa. O produto da venda das publicações  foi doado à Cruz Vermelha Brasileira.
Mas o  que Murce alcançou com esse feito quase lhe custa a vida, quando uns fanáticos seguidores da “quinta-coluna”, não satisfeitos em ver Hitler, Mussolini e Tojo ridicularizados, tentou agredir o radialista, quando de madrugada voltava para a casa.Ele defendeu-se com uma barra de ferro retirada de uma obra da Light e por ser um desportista, conseguiu  botar os três bandidos para correr.
Renato Murce possuía uma imensa capacidade de trabalho e na antiga Rádio Clube do Brasil, PRA-2 chegou a produzir nove programas por semana, entre musicais e humorísticos. Um deles foi “Sorrisos Colgate”. Tratava-se de uma emissora clandestina cujo prefixo  já despertava risos: Estação PRK-20 – Zoio d’água: 200 velocípede na Antonio- 500 kilovate na onda.
Contava com, além do autor, Lauro Borges, Castro Barbosa, Jorge Murad e Del Mundo.
Jorge Murad: humorismo "turco".

Depois Murad saiu da Rádio Clube e foi fazer sozinho  o humorístico “A pensão do Salomão”, que ficou no ar durante muitos anos.
Murad  gostava de interpretar turcos, libaneses  e sírios. Como a colônia imensa,tais personagens eram muito do gosto desses ouvintes.
Ele possuía um talento incrível para contar anedotas e interpretar tipos. Hoje faria sucesso no gênero que hoje denominamos  stan-up, que ele instintivamente inventou entre nós. Murad escreveu diversos livros de humor e outros somente com anedotas. Escreveu para o teatro e atuou em diversos filmes. Compôs também inúmeras marchinhas de carnaval. Creio que os humoristas que vieram depois, como Chico Anísio, José de Vasconcelos, para citar apenas os mais antigos, beberam em sua fonte.
                                                                         

José Vasconcelos:
 outro gênio do humor radiofônico. Fazia imitações


Chico Anysio, também fazia rir de cara limpa, no velho rádio.


Renato Murce:
precursor do humor no rádio com grande talento para escrever.

Mas voltando a Renato Murce. Como  ele estava muito sobrecarregado,  confiou no talento de Lauro e Castro Barbosa. É  que ambos eram brilhantes imitadores. Faziam, cada um, pelo menos umas dez vozes diferentes!  Foi ai que surgiu a PRK-20. Os primeiros programas ainda foram escritos por Murce, que depois deixou que a dupla seguisse só.
O sucesso foi tão grande, que logo outras emissoras atraíram a dupla com contratos tentadores. E lá se foi a PRK-20 para a Rádio Mayrink Veiga.

A PRK 20 VIRA PRK 30

No entanto, Murce detinha o título de PRK-20. Lauro Borges e Castro Barbosa,não pestanejaram: mudaram para PRK-30. O programa viria a se transformar num dos maiores fenômenos do rádio humorístico brasileiro, a partir da ideia genial de Renato Murce e do talento da famosa dupla.
Mas Murce e a dupla continuaram amigos. Tanto assim que
Era uma estação de rádio além de pirata, pirada. Por ela eram narradas partidas de futebol e corridas de cavalos com um locutor gago! Ele começava a transmitir com o verbo no presente e mudava o tempo para o passado,pois tudo o que tentava contar já havia acontecido a muito tempo.
O  âncora da programação era (pasme!) um locutor português, que anunciava as atrações ao “microinfame”. Havia uma fadista famosa, Maria Joaquina Dobradiça da Porta Baixa  e “um locutor de voz lantejoulada”, Megatério Nababo de Alicerce, que ao som do “rabo da mula” de Lizt , declamava versos apaixonados para  suas “queridas fanzocas”.
As passagens musicais e vinhetas eram a cargo de uma orquestra completamente desafinada e as mudanças de assunto pelas falas do   “apresentadores” era   marcada por batidas de um prato da bateria, quando então Megatério gritava: “E passemos a outro pograma”!

Ladeado por diretores da Nacional, Lauro Borges assina contrato.
 Castro Barbosa, de bigode  e Mario Brasine, presentes: retorno à Nacional

O PRK-30 carregava uma enorme audiência e sempre contou com bons patrocinadores. Depois de permanecer na Nacional por vários anos, recebe uma proposta tentadora da Rádio Tupi e da Cervejaria Brahma. E mais uma vez mudam de estação, uma vez que a Nacional não conseguiu cobrir a proposta.
Foi tudo muito rápido. A tal ponto, que na sexta-feira seguinte a emissora da praça Mauá viu-se na contingência de não ter o que colocar no ar ! Quem salvou a pátria foi Max Nunes, que desengavetou um velho projeto de programa de humor: um edifício muito louco em que coisas engraçadas aconteciam.

Max Nunes

Foi daí que, na emergência, surgiu  aquele que seria um dos mais famosos humorísticos do velho rádio: “O Edifício Balança, mas não cai”,estreando no inicio dos anos 50,  ficaria no ar por muitos anos e depois migraria para a televisão.


Foto histórica da estreia do Balança: Altivo Diniz, Floriano Faissal,Brandão Filho,Alfredo Viviane,Paulo Gracindo,Nilza Magrassi,a loura e Emma Dávila. Se você identificar atriz de estampado me conta.


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