OS PRIMÓRDIOS DO HUMOR RADIOFÔNICO
As raízes do humor estão nos
primeiros tempos do rádio, quando da encenação de esquetes rápidos, reunindo de dois a três atores e sempre com um final
engraçado.Muitos esquetes eram como que anedotas radiofonizadas. Era uma
maneira inteligente e chamar a atenção do público para uma nova forma de
interpretar, fugindo à linguagem teatral.
Nos anos trinta já havia
programas que exploravam o humor compondo quadros que se alternavam com números
musicais. Era o cerne dos programas montados, que surgiram mais tarde graças à
criatividade do produtor Almirante.
Almirante
Maio de 1938:
Alziro Zarur escrevia sobre rádio na revista Fon-Fon
Zarur, escrevia sobre rádio...
... depois se tornaria um grande radialista.
Começaram a surgir redatores de
programas humorísticos. A revista “Fon-Fon”, famosa publicação dos anos
trinta possuía uma seção de página inteira, assinada por Alziro Zarur,
destacado radialista que se tornaria mais tarde o presidente da Legião da Boa
Vontade. A seção se intitulava PR-1 Fon-Fon e na página 27 do número publicado
em 7 de maio de 1938 se podia ler:
Lauro Borges na PRE-8
A Rádio Nacional ganhou um elemento de primeiro plano em matéria de humorismo
radiophonico: Lauro Borges, o “az” da “Hora Sertaneja” e da “Hora Só ...rindo” da Transmissora, que agora
apresenta “A Buzina”, seu impagável
jornal falado, no Programma Palmolive”, uma das boas coisas da PRE-8.
"A Buzina", revista humorística através do rádio, precedeu uma rádio estranha:
PRK 20, depois PRK-30.(Capa do livro de P.Perdigão)
O Programa Casé apresentava esquetes engraçados:
cerne dos grandes programas humorísticos que viriam.
Lauro Borges:
gênio do humor radiofônico
Lauro Borges, 8 anos mais tarde estrearia na Nacional, juntamente com
Castro Barbosa, um dos maiores programas humorísticos do rádio: A PRK-30.
Mas voltemos à revista
Fon-Fon.Também na mesma página, ainda na seção do Zarur:
Almirante na PRE-8, está irradiando as suas famosas “Curiosidades
Musicaes”, programas de meia-hora magnificamente ensaiados e realizados com uma apresentação humorística
notável. Sem exaggero, póde-se dizer: as “curiosidades musicaes” de Almirante
constituem uma verdadeira sensação no “broadcasting” brasileiro.
Estamos no final dos anos trinta
e início da década de 1940.
Um dos programas humorísticos
pioneiros do rádio era escrito por Renato Murce e se chamou “Piadas do manduca”. Era uma escolinha de
adultos e crianças . Ficou no ar durante 25 anos, obtendo os primeiros lugares
junto ao Ibope. Ia ao ar aos domingos às 8 e meia da noite, perante o auditório
lotado da Nacional. Mas antes de se chamar “Piadas do Manduca” o programa se
intitulava “Cenas Escolares” e teve
muitos problemas com a censura do Estado Novo de Getúlio Vargas.
Atores de Piadas do Manduca:
Renato Murce, Lauro Borges,atriz não identificada, Castro Barbosa e Brandão Filho.
Você identifica a atriz? Poderia ser Alda Verona ou Anamaria,a dona Teteca? Me conta.
PRK 30 no ar!
A dupla fazia dezenas de vozes e produzia, sozinha, um programa de 25 minutos.
Grande patrocinador de PRK 30
por várias emissoras em que a dupla atuou.
Perfumaria Myrta S.A.
Outro grande anunciante da PRK 30,
que depois patrocinaria o Balança...
Transcrevo, a seguir, trecho do
excelente livro de Renato Murce “Bastidores do Rádio, já esgotado e que é um
excelente documento. Murce, uma das glórias do rádio brasileiro, escreveu:
As “Cenas Cariocas” representavam uma escola “bagunçada”. A professora
Dona Teteca (Anamaria) sofria horrores com a indisciplina e as travessuras dos
alunos: Manduca (Lauro Borges) Fedoca e Teleco, além do Coronel Fagundes
(Juvenal Fontes) e Seu Ferramenta
(Castro Barbosa). Aderiam às aulas no desejo de “aprender” alguma coisa.
O programa era o mais hilariante possível. Provocou uma onda enorme entre os ouvintes. A maioria gostava.
Uma minoria, onde se incluíam as
verdadeiras “Tetecas”, sem força moral junto a seus alunos, deu de protestar.
Dirigiram-se à Associação dos Pais de Família. Pediam sua intervenção para a
retirada do programa do ar. Foram ao DIP. No dia seguinte, recebíamos aviso de
que “Cenas Escolares” estavam proibidas. Obedecemos. Comunicamos, pelo microfone,
o fato aos nossos ouvintes. Recebemos mais de mil cartas e telegramas. Além de
inúmeros telefonemas de protesto.
Vários jornalistas escreveram sobre o assunto: Paulo Roberto, Orestes
Barbosa, Caio César Pinheiro e J. Caribe
da Rocha. Todos defendiam o programa. Diziam que era até educativo. Às
respostas estapafúrdias e disparatadas, seguia-se a necessária correção e a explicação daquilo que fora
argüido.
Renato Murce prossegue seu relato, dizendo que não desanimou e conhecendo bem a burrice do DIP, como ele
mesmo escreveu, teve uma ideia que acabou passando pela censura. A ação não se
passaria mais numa escola pública e sim na casa de uma professora aposentada.
Na primeira metade do programa acontecia um alegre bate-papo pontilhado de
piadas e situações engraçadas. Após o intervalo comercial, começa a “aula”
propriamente dita. O programa passou a chamar-se “Piadas do Manduca”. Manduca
era um menino sapeca e muito esperto que com tiradas hilariantes. Coronel
Fagundes, na Nacional era interpretado por Brandão Filho. Chegado do interior,
provocava risos com suas atitudes ora ingênuas, ora cheias da conhecida malícia
mineira. Seu Ferramenta era um imigrante
português, claro, torcedor do Vasco, que levava Dona Teteca ao desespero com
suas perguntas ingênuas e engraçadas.
Havia o doutor Leão, marido de Teteca. Doutor Leão era vivido pelo produtor do
programa Renato Murce. Ele ajudava a esposa a esclarecer dúvidas e procurava
manter o controle da situação quando a disciplina degringolava. Era sofisticado
no falar, possuía vasto conhecimento, ensinava coisas úteis, mas ficava
encalacrado quando o demônio Manduca se referia
“a uma certa francesa”. Mais tarde outros personagens foram
incorporados, como um imigrante turco, Seu
Nagib , interpretado por Alfredo Viviani e outros que eventualmente iam
visitar Dona Teteca.
O programa sempre se encerrava
com uma boa piada de efeito que levava o auditório às gargalhadas fundindo-se
ao sufixo, especialmente produzido e executado pelo conjunto regional de Dante
Santoro.
Hitler...
Mussolini...
General Tojo...
O histrionismo dos três era um prato cheio para o humor de Renato Murce
Estamos em agosto de 1942. Eis
que Renato Murce tem uma ideia
criativa que lhe rendeu imensa
popularidade e respeito. Baseado na peça
de Júlio Dantas, A Ceia dos Cardeais, Murce
escreveu a série O rega-bofe dos
Vândalos, ridicularizando, a partir do humor, Hitler,Mussolini e Tojo, o
primeiro-ministro japonês.
Transmitido na época em que
nossos pracinhas lutavam na Itália, o sucesso de público foi estrondoso. Várias
emissoras em todo o país solicitavam a retransmissão e Murce passou a escrever uns folhetos com as
histórias do programa. O produto da venda das publicações foi doado à Cruz Vermelha Brasileira.
Mas o que Murce alcançou com esse feito quase lhe
custa a vida, quando uns fanáticos seguidores da “quinta-coluna”, não satisfeitos em ver Hitler , Mussolini e
Tojo ridicularizados, tentou agredir o radialista, quando de madrugada voltava
para a casa.Ele defendeu-se com uma barra de ferro retirada de uma obra da
Light e por ser um desportista, conseguiu
botar os três bandidos para correr.
Renato Murce possuía uma imensa
capacidade de trabalho e na antiga Rádio Clube do Brasil, PRA-2 chegou a
produzir nove programas por semana, entre musicais e humorísticos. Um deles foi
“Sorrisos Colgate”. Tratava-se de uma emissora clandestina cujo prefixo já despertava risos: Estação PRK-20 – Zoio d’água: 200 velocípede na Antonio- 500 kilovate na onda.
Contava com, além do autor, Lauro
Borges, Castro Barbosa, Jorge Murad e Del Mundo.
Jorge Murad: humorismo "turco".
Depois Murad saiu da Rádio Clube
e foi fazer sozinho o humorístico “A
pensão do Salomão”, que ficou no ar durante muitos anos.
Murad gostava de interpretar turcos, libaneses e sírios. Como a colônia imensa,tais
personagens eram muito do gosto desses ouvintes.
Ele possuía um talento incrível
para contar anedotas e interpretar tipos. Hoje faria sucesso no gênero que hoje
denominamos stan-up, que ele instintivamente inventou entre nós. Murad escreveu
diversos livros de humor e outros somente com anedotas. Escreveu para o teatro
e atuou em diversos filmes. Compôs também inúmeras marchinhas de carnaval.
Creio que os humoristas que vieram depois, como Chico Anísio, José de
Vasconcelos, para citar apenas os mais antigos, beberam em sua fonte.
José Vasconcelos:
outro gênio do humor radiofônico. Fazia imitações
Chico Anysio, também fazia rir de cara limpa, no velho rádio.
Renato Murce:
precursor do humor no rádio com grande talento para escrever.
Mas voltando a Renato Murce.
Como ele estava muito
sobrecarregado, confiou no talento de Lauro
e Castro Barbosa. É que ambos eram
brilhantes imitadores. Faziam, cada um, pelo menos umas dez vozes
diferentes! Foi ai que surgiu a PRK-20.
Os primeiros programas ainda foram escritos por Murce, que depois deixou que a
dupla seguisse só.
O sucesso foi tão grande, que
logo outras emissoras atraíram a dupla com contratos tentadores. E lá se foi a
PRK-20 para a Rádio Mayrink Veiga.
A PRK 20 VIRA PRK 30
No entanto, Murce detinha o
título de PRK-20. Lauro Borges e Castro Barbosa,não pestanejaram: mudaram para
PRK-30. O programa viria a se transformar num dos maiores fenômenos do rádio
humorístico brasileiro, a partir da ideia genial de Renato Murce e do talento
da famosa dupla.
Mas Murce e a dupla continuaram
amigos. Tanto assim que
Era uma estação de rádio além de
pirata, pirada. Por ela eram narradas partidas de futebol e corridas de cavalos
com um locutor gago! Ele começava a transmitir com o verbo no presente e mudava
o tempo para o passado,pois tudo o que tentava contar já havia acontecido a
muito tempo.
O
âncora da programação era (pasme!) um locutor português, que anunciava
as atrações ao “microinfame”. Havia uma fadista famosa, Maria Joaquina Dobradiça
da Porta Baixa e “um locutor de voz
lantejoulada”, Megatério Nababo de Alicerce, que ao som do “rabo da mula” de Lizt , declamava versos apaixonados para suas “queridas fanzocas”.
As passagens musicais e vinhetas
eram a cargo de uma orquestra completamente desafinada e as mudanças de assunto
pelas falas do “apresentadores”
era marcada por batidas de um prato da
bateria, quando então Megatério gritava: “E passemos a outro pograma”!
Ladeado por diretores da Nacional, Lauro Borges assina contrato.
Castro Barbosa, de bigode e Mario Brasine, presentes: retorno à Nacional
O PRK-30 carregava uma enorme
audiência e sempre contou com bons patrocinadores. Depois de permanecer na
Nacional por vários anos, recebe uma proposta tentadora da Rádio Tupi e da
Cervejaria Brahma. E mais uma vez mudam de estação, uma vez que a Nacional não
conseguiu cobrir a proposta.
Foi tudo muito rápido. A tal ponto,
que na sexta-feira seguinte a emissora da praça Mauá viu-se na contingência de
não ter o que colocar no ar ! Quem salvou a pátria foi Max Nunes, que desengavetou um velho projeto de programa de humor: um edifício muito louco em que coisas engraçadas aconteciam.
Foi daí que, na emergência, surgiu aquele que seria um dos
mais famosos humorísticos do velho rádio: “O Edifício Balança, mas não cai”,estreando no inicio dos anos 50, ficaria no ar por muitos anos e depois migraria para a televisão.
Max Nunes
Foto histórica da estreia do Balança: Altivo Diniz, Floriano Faissal,Brandão Filho,Alfredo Viviane,Paulo Gracindo,Nilza Magrassi,a loura e Emma Dávila. Se você identificar atriz de estampado me conta.
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