quinta-feira, 7 de abril de 2016

PRODUTORES E NOVELISTAS DO VELHO RÁDIO


O termo produtor tem conotações diferentes para rádio, teatro, cinema e televisão.
No teatro e no  cinema  o produtor é aquele que entra com o dinheiro, financiando a produção.
Na televisão o produtor é aquele profissional que gerencia a produção do programa e dá  as condições  de trabalho que o viabilize.
No cinema, no teatro e na televisão, portanto, produtor não dirige atores. Isso é  tarefa do diretor.
Já em rádio, o produtor é aquele que  cria, escreve o programa. È o autor do programa.
Se o produtor escreve crônicas é um cronista, se escrevia  comentários que eram lidos por locutores, era um comentarista. Se produzia novelas era um novelista.

As primeiras radionovelas da Nacional nos anos 40 eram todas importadas. Especialmente cubanas, a começar por Em busca da felicidade .
 No entanto, na medida  que o radioteatro   ia se consolidando e absorvendo a tecnologia  dos  roteiristas estrangeiros, foi se formando uma verdadeira escola de adaptadores para o rádio no Brasil, caminho aberto pelo gênio de Gilberto de Andrade.

Mas o trabalho dos novelistas não ficou restrito apenas às adaptações. Começaram a surgir os autores.  Neste período, destaque para Oduvaldo Viana e  Amaral Gurgel.Consultando os arquivos da Nacional, entre 1941 e 1959 foram escritas cerca de 807 novelas, movimentando 118 autores. Quase 10 por cento da totalidade dessas a novelas, foram de autoria de Oduvaldo Viana.

Oduvaldo Viana, pai do Vianinha:
 pioneiro foi um dos maiores novelistas do rádio

Amaral Gurgel, talento do velho cinema: 
sucesso no velho rádio



Eurico Silva, que se tornou famoso pela adaptação de O direito de nascer viria a escrever mais de 40 novelas para a Nacional. Destaque para Amanhã seremos nós.
Ensaio de radioteatro na Nacional anos 50: 
Eurico Silva, de branco, entre Floriano Faissal e Domingos Martins


UMA MÁQUINA DE CRIAR EM CIMA DE UMA MÁQUINA DE ESCREVER.

Os novelistas,tanto da Nacional quanto da Tupi e da Tamoio, não levavam boa vida. Era trabalho duro manter no ar uma novela com três capítulos semanais de 23 minutos e ainda por cima ter que redigir comerciais.E isto porque os textos publicitários, que iam ao ar nos intervalos comerciais, eram feitos pelos próprios escritores.
Mais tarde a Nacional, sempre em busca da perfeição, criou a figura do redator comercial. Eram escritores de gabarito que se dedicavam a produzir textos comerciais e criativos. Oranice Franco, antes de se consagrar como produtor  (As histórias do Tio Janjão), produziu textos comerciais).Além das novelas, muitos autores escreviam também esquetes, programas humorísticos, musicais e programas montados.Muitos, além disso, atuavam no microfone, como Mário Brasini, Cícero Acaiaba,Walter Foster,Álvaro Aguiar, Mário Lago com seu "Presidio de mulheres" e outros.Escrever,portanto, era uma obsessão para muitos, que tinham que cumprir suas tarefas e entregar os textos a tempo e a hora. Por isso valia tudo.A estrela Ísis de Oliveira, em depoimento ao Museu da Imagem e do Som revelou que os novelistas roubavam as falas dos atores e as colocava nos personagens, transferia para os textos conversas e desabafos que captava pelos corredores.
Walter Foster novelista e radioator


Álvaro Aguiar era o Tio Janjão, seriado infantil de Oranice Franco. 
Oranice ingressou mais tarde na Academia Brasileira de Letras.
Alvaro também escrevia As aventuras do Anjo.


Mário Lago, compunha, atuava e batalhava na máquina de escrever.

 Mário Brasini:
"Sou uma máquina de criar, em cima de uma máquina de escrever. Chego na emissora de manhã e nunca saio antes das 11 da noite".

Dinah Silveira de Queiroz escrevia textos para a Nacional, antes de ingressar na Academia Brasileira de Letras

Cesar Ladeira interpretava diariamente às 13 horas "Cronica da Cidade" que Genolino Amado escrevia. Genolino foi outro que também ingressou na A.B.Letras.



SILENCIO! ESCRITORES TRABALHANDO.

No 22o. andar, Floriano Faissal criou uma área em que alguns novelistas dispunham de um espaço onde poderiam escrever e guardar seu material. Eram pequenos boxes de meia parede, onde cabia apenas uma mesa com máquina de escrever  e um arquivo.Vários novelistas dividiam esse pequeno espaço, trabalhando em turnos.Do lado de fora se ouvia o martelar das máquinas de escrever e se evitava fazer algazarra para não atrapalhar quem estava escrevendo.Outros produtores possuíam instalações no 20º. andar. Boa parte deles, no entanto, escreviam fora da emissora. Como a demanda por novelas era muito grande, com frequência, a Nacional simplesmente comprava os textos de  autores que não faziam parte de seus quadros permanentes. Com a valorização do gênero, as empresas de publicidade ou simplesmente adquiriam textos dos autores ou contratava novelistas para escreverem com exclusividade. Gilberto Martins estava incluído neste último caso.

SUBLITERATURA?
Os novelistas faturavam bem e certamente por isso, começaram a despertar uma certa inveja entre os escritores tradicionais. Com frequência eram acusados por estes de produzir subliteratura para o rádio.Não era bem assim. Embora algumas concessões tivessem que ser feitas para atender aos patrocinadores, a grande maioria produzia uma literatura para o rádio que os ouvintes consumiam e os incentivavam a fazer cada vez melhor. Muitos que escreviam para rádio acabaram por se consagrar nas letras e ingressaram na Academia. Entre eles Viriato Correia, Oranice Franco,Genolino Amado, Dinah Silveira de Queiroz, Dias Gomes,  entre outros.
Alguns patrocinadores relutavam em aceitar novelas extraídas da literatura universal. Mas quando alguns novelistas conseguiam romper a barreira, os ouvintes apreciavam e os editores adoravam. È que era comum os ouvintes promoverem uma corrida às livrarias para comprar o livro, a fim de conhecer o final da novela.
Mas isto era muito pouco, pois em um país com os altos índices de analfabetismo dos anos 50, teria sido desejado que as grandes obras da literatura universal houvessem ocupado um espaço maior no nosso radioteatro.Destaque para Dias Gomes que sempre foi um produtor preocupado em levar para o público obras clássicas da literatura. Pôde fazer isso no projeto do Grande Teatro. Também a Rádio Ministério da Educação que não possuía compromissos com patrocinadores, chamou para si a tarefa de valorizar mais os autores clássicos.


Dias Gomes: 
 talento no rádio, foi para o teatro, televisão e cinema. 
Outro que ingressaria na Academia Brasileira de Letras.




GIUSEPPE  GHIARONI DA VIDA DE CRISTO A TANCREDO & TRANCADO

Ghiaroni escrevia muito para o horário das 9 da noite  e tem mais de duas dezenas de títulos no acervo da rádio. Isso nos anos 40 e 50, quando era responsável por seis programas semanais e uma  novela.
Aos domingos iam ao ar dois programas seus: na hora do almoço entrava no ar “Romance Musical”. Era uma história contada em 30 minutos. Ghiaroni pegava uma música popular e da letra tirava uma história, interpretada pelo elenco de radioteatro. A música ia sendo tocada aos poucos, acompanhando o andamento do enredo. Muito interessante!
Era um dos poucos programas gravados. A gravação era durante a semana, feita num disco acetato de 15  polegadas.O outro programa dominical de Ghiaroni e um de seus grandes sucessos foi a série “Tancredo e Trancado”, que durante muitos anos animou o final de domingo no auditório da Nacional.  O extraordinário poder de concisão de Ghiaroni possibilitavam uma história completa,  com princípio, meio e fim a cada semana, em apenas vinte e cinco minutos! Participavam, além de Brandão Filho, Apolo Correia e Ema Dávila, Paulo César,(geralmente o vilão), Álvaro Aguiar, Bruno Neto e outros. 
Apolo Correia era o Trancado.
 O nome do engraçado personagem diz tudo.

Ema Dávila, mulher de Tancredo tentava por ordem nas coisas

Brandão Filho:
 o detetive Tancredo, enrolado e engraçado. No final, tudo dava certo nas histórias de Ghiaroni

Depois do sucesso da “Vida de Nosso Senhor Jesus Cristo, o talentoso autor se debruçaria mais uma sobre a Bíblia, radiofonizando trechos muito bonitos  do Velho Testamento em capítulos de 25 minutos, às 9 da noite, tendo novamente César Ladeira como narrador e a participação dos astros do elenco do radioteatro.                                        A  sonoplastia  do programa  era extraída, principalmente,  das trilhas sonoras de filmes bíblicos  que haviam sido exibidos no Rio: “Os Dez Mandamentos”, “O Manto Sagrado” e “Rei dos Reis”.                                                                                                     Isso aconteceu no início dos anos 60.

Aos cobras acima citados, juntaram-se autores jovens que dominavam com maestria a técnica de escrever novelas.      Entre    esses   posso   me        lembrar                      de
Cícero Acaiaba, Ivani Ribeiro,  J.Silvestre  e Janete Clair entre outros.



Ghiaroni: 
talento para escrever A vida de Cristo e as trapalhadas de Tancredo e Trancado

Ivani Ribeiro, era assim quando começou na escrever para o rádio

Ivani Ribeiro: sucesso memorável nas telenovelas.

J. Silvestre escrevia novelas e era radioator

J. Silvestre migrou para a televisão. 
Quem se lembra de O céu é o limite?

CICERO ACAIABA E A MELANCÓLICA PRIMAVERA SEM FLORES.

Sobre Cícero Acaiaba: quando escrevia meu livro, soube que ele estava vivendo em Varginha, Sul de Minas Gerais e viajei até lá com Nylza, minha mulher, quando gravei depoimentos dele que foram  incluídos nesse livro. 
Cícero começou como radioator e logo em seguida passou a acumular as funções de novelista. Durante os dezessete anos em que atuou na Nacional, escreveu cerca de cento e trinta novelas, a maioria patrocinada pela Sidney Ross.
Contou-me Cícero que  chegou a escrever duas novelas diferentes ao mesmo tempo.
Para não se confundir com as duas tramas, ela tinha uma estratégia: usava  uma máquina de escrever para cada novela.
Cícero era ligado ao Partido Comunista. Amigo de Mário Lago, Jorge Amado e Graciliano Ramos.
Tal ligação custou-lhe muito caro, pois quando  veio o movimento de 64 e estava no ar a novela “Primavera sem flores” ele foi punido: respondeu a três inquéritos

 militares. Seu pagamento foi suspenso,  embora a novela continuasse no ar, mas com o nome do autor omitido.Grande talento, escreveu diversos livros e até terminar seus dias,  no Sul de Minas, colaborando com contos diários no jornal local.Seu último romance chamou-se Meu pé direito, uma referência a um defeito de nascença no pé que o obrigava a um calçado especial.



                            O  último romance de Cicero Acaiaba chamou-se Meu pé direito, 
                    uma referência a um defeito de nascença que o obrigava a um calçado especial                             


10 comentários:

  1. Pois e... emocionante esses escritos e as respectivas fotografias,daqueles que um dia,eu,ainda muito pequeno,os elegi como os meus idolos: OS NOVELISTAS DE RADIO!!... Como conheci e conheço esses nomes!!... No inicio da decada de 1970,iamuito a Radio Nacional,levando meus escrito originais e adaptaçoes,principalmente para o TEATRO EM CASA,(antigo GRANDE TEATRO ORNIEX),a diretores como Dayse Lucidi ou Jose Valuzi,dos quais eu so obtinha meros elogios sobre os textos e nada mais... Apos a leitura do Livro do Prof Roberto Salvador,A ERA DO RDIOTEATRO,e que eu pude compreender muita coisa...

    ResponderExcluir
  2. Pois e... emocionante esses escritos e as respectivas fotografias,daqueles que um dia,eu,ainda muito pequeno,os elegi como os meus idolos: OS NOVELISTAS DE RADIO!!... Como conheci e conheço esses nomes!!... No inicio da decada de 1970,iamuito a Radio Nacional,levando meus escrito originais e adaptaçoes,principalmente para o TEATRO EM CASA,(antigo GRANDE TEATRO ORNIEX),a diretores como Dayse Lucidi ou Jose Valuzi,dos quais eu so obtinha meros elogios sobre os textos e nada mais... Apos a leitura do Livro do Prof Roberto Salvador,A ERA DO RDIOTEATRO,e que eu pude compreender muita coisa...

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Bom dia! Li seu comentário...eu estava aqui procurando uma foto do José Valuzi apenas para ver como ele era...e vc chegou a conhecê-lo pessoalmente muito legal gostaria gostaria de ter tido essa sorte..sabe me dizer onde posso encontrar foto dele ja garimpei bastante na internet mas não encontrei...sou fã do teatro de Misterio...ass. Marcos Gomes - Curitiba/Pr

      Excluir
    2. Estimado Marcos, muito e muito obrigado por seu comentário! Também não possuo em meus arquivos nenhuma foto do Valuzi. O negócio é que naquela época não se tirava tanta foto como hoje. Muito se perdeu em termos de memória visual. Que pena!

      Excluir
  3. Qiantos genios passaram pelo nosso radio

    ResponderExcluir
  4. O rádio era uma usina de criatividade. Quem fez bom rádio se deu bem em qualquer outro veiculo, Lucas. Grande abraço!

    ResponderExcluir
  5. Olá, Roberto, como vai? Estou atrasado, preciso ler seu livro, sem falta. Eu coleciono programas antigos de rádio, principalmente radioteatro, sabe como posso encontrar programas? Há algum colecionador com quem posso falar? Obrigado por qualquer ajuda, desde já. Quem souber, pode responder, por favor.

    ResponderExcluir
  6. Obrigada aos saudosos Domício costa e Deise lúcidi eternas vozes do rádio.

    ResponderExcluir
  7. Trabalhei com ambos na Nacional. Eram admiráveis figuras humanas. Obrigado por seu comentário, Cleusa. Visite meu canal no Youtube A Historia do Radio Roberto Salvador. Você vai gostar

    ResponderExcluir
  8. Ola, que ano morreu a radio atriz Lurdes Santana do Teatro de Mistério?
    Jose Valuzi ainda ta vivo?
    Grato

    ResponderExcluir