sábado, 5 de março de 2016

RADIOCACETADAS NA NACIONAL.

O QUE SÃO RADIOCACETADAS?
Você, certamente, conhece as videocacetadas do Programa do Faustão, certo?
Pois bem: inventamos as radiocacetadas, que são os erros, os tropeços, as falhas dos profissionais do rádio. Errar é humano e quando o programa é ao vivo não há jeito de consertar. Às  vezes, tentar consertar complica mais as coisas. Como diz o velho ditado: "a emenda é pior do que o soneto".
Colecionei uma série de falhas no nosso velho rádio e relato para vocês agora.
Ressalto mais uma vez, que os programas na época, eram todos ao vivo. Algumas gravações eram feitas durante a transmissão e foi graças a esses registros e a fatos narrados por colegas, que tais gafes passaram à história. 
Vamos a mais algumas.

OS SOLDADOS E AS FRALDAS EFECÊ.

O veterano repórter  Roberto Reis me contou o que aconteceu com o locutor Aurélio de Andrade na novela das nove da noite na Nacional. O patrocinador eram os fabricantes das famosas fraldas Efecê. Para o seu bebê fraldas Efecê, dizia o competente locutor fundador da Rádio Nacional.
Acontece que durante a Segunda Guerra Mundial as fábricas foram obrigadas a destinar parte de seu horário para a produção de material destinado aos combatentes. A indústria Efecê deixou então de produzir as famosas fraldas para fabricar uniformes. Uma noite, o Brasil inteiro ligado e Aurélio, com sua voz solene, deveria anunciar:
Senhores ouvintes a fábrica Efecê comunica aos seus distintos clientes que está deixando de fabricar fraldas para fabricar fardas para os pracinhas brasileiros.

Mas o que saiu no ar foi:

Senhores ouvintes a fábrica Efecê comunica aos seus distintos clientes que está deixando de fabricar fardas para fabricar fraldas para os pracinhas brasileiros.

Ele e outros atores no estúdio não perceberam tão compenetrados que estavam. Mas o pessoal da técnica, sim. E quando terminou o capítulo foi aquela gozação. Muitos ouvintes também perceberam e reclamaram junto à emissora.

Mas retificar... jamais!
Locutor Aurélio de Andrade
 era assim quando fundou a Nacional em 1936


 PROFISSÃO ANGELICAL E DESABAFO NA PONTE
 Certa vez, meu grande e querido amigo Rodney Gomes, estreou um tipo nas Aventuras do Anjo.Esse personagem se chamava Jarbas e foi interpretado por Rodney por muitos anos.
Álvaro Aguiar, intérprete do  papel título e autor do seriado havia criado esse tipo especialmente para  o jovem Rodney.
Logo na abertura do capítulo, após uma cena de luta, Rodney, ofegante, tinha que exclamar para o Anjo:

 RODNEY – Anjo, você é  demais ! Anjo  eu quero ser um detetive igual a você!  Anjo, Anjo !
                      Eu quero seguir a sua profissão !


 Mas na empolgação Rodney trocou  a última palavra e a frase ficou assim:

  RODNEY               -       Anjo, Anjo, eu quero seguir a sua  procissão !

Álvaro Aguiar, profissional experimentado  consertou na hora:

ÁLVARO                -  Sou Anjo, mas não sou santo. Você deve seguir é a minha profissão.

Esta também aconteceu no Anjo. Em meio a uma cena de ação o ator deveria gritar desesperado:
Anjo, cuidado! A ponte vai desabar!
Mas o que saiu foi:
Anjo, cuidado! A ponte vai desabafar!
Álvaro Aguiar escrevia e protagonizava o Anjo


Mas, Josecy Lira Lima protagonizaria também uma radiocacetada. É ele mesmo que nos relata.

Foi no Teatro de Ministério. Naquele período o programa era gravado. Felizmente! Eu era o locutor do horário. Abri o programa, li o comercial e me sentei no sofá, esperando o intervalo para ler o outro comercial. Estava distraído, pensando na vida, enquanto o teatro seguia. De repente, cumprindo o script, o contra regra dispara um tiro de revólver bem atrás de mim! Levei um susto descomunal e dei um grito que vazou no microfone. O elenco caiu na gargalhada, a gravação parou e meu coração disparou. Tive que aguentar a gozação dos colegas.

Teatro de Mistério, sucesso de duas décadas no ar.

Recolhi numa revista Radiolândia, do ano de 1954, na coluna O rádio  por dentro, assinada pelo jornalista Peri Scópio o seguinte texto, que fala dos tropeços de alguns locutores.
Um dia desses abrimos o rádio. Um clic e lá vem besteira: “Ligítimas lâminas gileti”. Rodamos o dial e outro  baixo:”Tenha em seu cabelo um lindo tapete”. Devia ser “topete”.,mas... Continuamos rodando o botão miraculoso e o que ouvimos, ó Misericórdia! Uma voz máscula de  locutor , cometendo a terrível gafe: “Amigo ouvinte faça como eu que só uso Soutiens Celeste”. E lembramo-nos então de um locutor da Mayrink  que anos atrás cometeu erro semelhante. Uma voz nada feminina  aconselhou:”Faça como eu amiga ouvinte, que uso apenas Regulador Xavier.”  Erro do locutor ou de quem lhe preparou o texto?

Os redatores também erravam.  O programa  Pausa para a meditação era patrocinado por Abel de Barros e Companhia Limitada, tradicional rede de venda de tintas, na época. O redator comercial da emissora era o experiente  Jayme Faria Rocha que na pressa entregou o seguinte texto que o locutor leu com voz grave:
Abel de Barros e Companhia Limitada ao iniciar mais este programa, deseja a todos os seus ouvintes um Feliz Natal e um próspero Ano Novo.
Tudo bem se nós não estivéssemos em pleno mês de maio! O Jayme pegou a ficha com o texto de final de ano ao invés de selecionar a mensagem em homenagem ao dia das Mães. O patrocinador ficou tão alucinado que ameaçou tirar o patrocínio do famoso programa de Júlio Louzada.

POBRE DO BEBE NO VERÃO! ...
Certa vez, no intervalo comercial de Romance no Ar que ia ao ar de segunda a sexta-feira ao meio dia e meia  o locutor exclusivo da Sidney Ross, fabricante do famoso Talco Ross, um dos grandes anunciantes de novelas da Nacional deveria dizer o seguinte texto:
...Mãe, como vai o seu bebê com esse calor atroz?
Mas na hora houve um pequeno erro e o que foi para o ar foi:
...Mãe, como vai o seu bebê com esse calor atrás?
Essa é antológica e os mais veteranos devem se lembrar dessa história.


Talco Ross e o calor atroz


NARRADOR TURBINADO NA ONU

Luís Manuel,começou na Nacional quando era menino. Radioator brilhante, depois se transformou em um de nossos mais importantes dubladores. Pois é ele que me conta esta. Saint-Clair Lopes-  o Pilatos de O romance da eternidade e dom Rafael Juncal de O direito de nascer - foi contratado  pela Organização das Nações Unidas. Isso foi motivo de orgulho de seus colegas do radioteatro. Cumprido o contrato ele retorna à emissora e recebe uma homenagem através de um Especial. Eis que o ator Antonio Laio, que frequentemente fazia papéis de vilão, desta vez vai atuar como narrador do programa. Logo na abertura,há uma cena que remete ao auditório da Assembléia Geral da ONU. Laio com sua voz poderosa, com direito à câmara de eco e tudo, deveria dizer:
Senhores: do alto dessa tribuna eu vos saúdo!
Mas o que saiu foi:
Senhores: do alto dessa turbina eu vos saúdo!
Saint Clair Lopes:
 de dia chefiava o departamento jurídico.À noite brilhava no radioteatro


FALTAM LEITOS NA ENFERMARIA

Outra contada por Luís Manuel.
Havia um programa montado noturno, na Nacional, chamado Viva a Marinha! Coro, grande orquestra e elenco de radioteatro.Numa dramática cena de guerra, um enfermeiro,interpretado por Domício Costa dirigia-se ao oficial-médico e tinha apenas  que dizer:
Senhor, a enfermaria está cheia!
Acontece que Domício estava chateado, porque grande artista, havia sido escalado naquela noite apenas para dizer esta frase.Como a coisa era simples,deixou de lado o script e decorou a frase para dizê-la no momento exato. O programa seguia normal.
Ao sinal do diretor, disparou, então com seu lindo vozeirão:
Senhor, a enfermeira está cheia!
A orquestra atacou de acordes dramáticos.
E ficou no ar uma pergunta que não calou:
Quem havia enchido a enfermeira?
Domício Costa:
Um dos maiores nomes do radioteatro, dirigiu a Nacional nos anos 80'.


QUINTAL CERCADO.

Essa história de trocar letras é muito comum em rádio. Até hoje. È que o locutor ou radioator e até nós mesmos, no cotidiano, não lemos uma palavra, sílaba por sílaba. O que lemos é o perfil da palavra. È ai que a coisa acontece. Como aconteceu com Jaime Filho, numa novela na Tupi, segundo me contou Geraldo José.
Em determinada cena, interpretava um policial que gritava para o ladrão: Não adianta fugir. O quintal está cercado! Mas na hora saiu:
Não adianta fugir! O cercado está quintado!
 Geraldo José me contou esta história.
 Aqui, tendo a esquerda Gerdal dos Santos e o autor do blog.


MICROFONE DELIVERY

O veterano e excelente casal de atores Elza Gomes e André Villon, vieram do teatro e portanto, não possuíam experiência em rádio. Mas a convite de Vitor Costa concordaram em atuar no radioteatro. E ambos saíram-se muito bem, interpretando personagens memoráveis nas radionovelas da PRE-8. Porém ficavam muito nervosos na hora de entrar no ar.
Estou acostumado a atuar em um palco para um público que está diante de mim. Aqui tenho que atuar para um microfone, frio e imóvel, dizia André.
Mas o talento de Elza e André  era tamanho que eles se superaram. Porém, não sem nervosismo.
Uma noite, André Villon interpretava uma novela e  tinha que ler um imenso texto. E ele lia muito bem.
No decorrer da cena, Floriano, atendendo a sinais do operador, gesticulou para o ator, a fim de que se aproximasse mais do microfone. Com o rabo dos olhos, André, interpretou erroneamente os gestos do diretor  e ao invés de se aproximar do microfone, pegou-o e com dificuldade, já que tinha uma das mãos ocupadas pelo script, saiu carregando o pesado pedestal pelo estúdio,tentando levá-lo até onde estava Floriano. Isso sem interromper a fala! Detalhe, o microfone mais o pedestal com sua base pesam cerca de dez quilos.
A sorte é que alguém percebeu o que estava ocorrendo e salvou a situação.
André Villon: começo no teatro... 

...depois foi para o radioteatro.


Elza Gomes, mulher de Villon.
Casal que brilhou


CAPANGAS CAPENGAS.

Mais uma de trocar letras.
Esta aconteceu durante a encenação de um dos capítulos de Jerônimo. André Villon fazia o papel de um poderoso coronel do sertão, que ameaçadoramente deveria gritar para o nosso  herói:
Jerônimo,você não vai ficar livre de mim! Vou mandar meus capangas atrás de você!
Mas a ameaça de Villon saiu assim:
Jerônimo,você não vai ficar livre de mim. Vou mandar meus capengas atrás de você!
Milton Rangel, tentando consertar a cena ainda perguntou, do alto de seu cavalo:
Você vai mandar o quê???
E Villon, sem perceber que havia errado a palavra:
Você ouviu muito bem. Vou mandar meus capengas atrás de você.
O mais curioso foi que, anos depois, o autor Moisés Veltman acabou criando um vilão, inimigo de Jerônimo chamado Capenga.
Por sinal, este foi o último inimigo de Jerônimo. Pois a série acabou aí. E quem interpretou o Capenga foi Luís Manuel.
Milton Rangel era o Jeronimo no rádio.

Jacira Domingues, Nelly Amaral e Milton Rangel:
 emoção das novelas da Nacional

Melhoral patrocinou Jeronimo por muitos anos, nas tardes-noites da Nacional

E por falar em Luís Manoel, vou contar outra vivida por ele.Vez por outra as novelas utilizavam murmúrios, burburinhos de pessoas falando em fundo. Eram clássicas as cenas de tribunal em que vez por outra o público presente se manifestava fazendo comentários que saiam como murmúrios. Nesses momentos, os atores presentes no estúdio, ao sinal do diretor, começavam a murmurar. Para ficar bem natural, os atores compunham frases a meia voz. Em casa o que o ouvinte percebia eram murmúrios. Tudo bem. De farra, alguns radioatores, geralmente os mais jovens e sacanas aproveitavam e diziam asneiras a meia voz, tipo:
Você quer beijar minha barriga?                                                 Por favor, senta no meu pau! Quando acabar a novela paga meu café seu viado?
E outras asneiras que misturadas não dava para perceber o teor.
Um dia, como o capítulo seria previamente gravado, Luís Manoel, que já era adulto e outros que gostavam de molecagem, resolveram pregar uma peça no companheiro Antonio Laio.
Eis a história contada pelo próprio Luís: combinamos que no momento do vozerio, falaríamos as bobagens, mas a um sinal meu, todos se calariam subitamente. Antonio Laio que também gostava de falar sacanagens nessa hora, não sabia da armadilha. O capítulo seguia normalmente. Chegada a hora do vozerio, começamos,então a falar sacanagens. De repente paramos e deixamos o Laio sozinho. Durou apenas três segundos mas  deu para ouvir o Laio dizer claramente:
Por favor,aperta meu rabo!
Bem só fizemos isso porque era gravado, claro!

EMPADINHAS AO VIVO.

Esta me foi contada por Carmem Sheila.
Na Nacional havia um casal que trabalhava no setor administrativo. Para reforçar o orçamento,marido e mulher decidiram que ele venderia as empadinhas deliciosas que a mulher fazia.
Assim, o marido as acondicionava cuidadosamente, numa caixa de papelão,dessas que embalam camisas de homem, e percorria os setores da emissora, vendendo os salgadinhos que eram imediatamente consumidos. Era fazer e vender.
Uma tarde, no estúdio Vitor Costa, uma novela transcorria normalmente, numa cena romântica. Eis que a porta do estúdio se abre abruptamente e ouve-se a voz estridente do incauto vendedor:
Vai empadinha, ai ???
Carmem Sheila não se lembra do desfecho do incidente, mas a partir de então, jamais empadinhas foram vendidas  nas proximidades do estúdio de radioteatro.

O FAMIGERADO DEDOBOL NO TERRAÇO DO PRÉDIO.
UM SAPATO VOA NO MEIO DA TARDE SOBRE OS CÉUS DA PRAÇA MAUÁ

A mesma Carmem Sheila me relatou esta também.
Entre um programa e outro o artista tinha, muitas vezes, intervalos de horas. Para matar o tempo, os homens descobriram um jogo que consistia em uma tábua de madeira com uns preguinhos que representavam os jogadores de futebol dispostos em campo. Havia também uma bolinha feita a mão, de papel laminado. O jogo consistia no seguinte: os dois adversários iam dando petelecos na bolinha para ver quem chegava primeiro ao gol. Dava gosto ver os marmanjos disputarem.  Havia até torcida e um campeonato!A jovem Juraciara Diácovo era uma das campeões do dedobol.As partidas tinham lugar sobre a mureta do terraço do prédio. Certa vez a novela ia entrar no ar e nada dos atores aparecerem no estúdio. Foi preciso que alguém, desesperado, fosse chamar o elenco lá fora.
Quando soube disso, Floriano Faissal, possesso, mandou quebrar a tal da tábua, não sem ameaças de punição.
Em vão:meses depois, lá estava o dedobol de volta.
Esta me foi narrada por minha querida amiga Juraciara.
Os homens fabricavam bola de meia e jogavam no terraço, também para passar o tempo. Certa vez, o Carlos Marques (radioator) ganhou de presente de “seu”Floriano um vistoso par de sapatos.No dia em que estreava os sapatos, passou pelo terraço e viu a turma batendo bola. Não resistiu e  entrou no jogo. Oh! Decepção: logo no primeiro lance ao tentar um chute um dos sapatos se soltou do pé e voando pela mureta foi cair na praça Mauá 22 andares a baixo.
Juraciara Diácovo, grande parte de sua vida nos estúdios da Nacional


Coube a Carlos Marques ter que passar o dia todo atuando nas novelas com um pé descalço e outro calçado. Sorte que não era programa de auditório.

Carmem Sheila: 
de menina radioatriz a dubladora de sucesso.



                                            
Carlos Marques, quando radioator levou emoções.
Depois, dublador, emprestou sua voz aos personagens dos filmes.


Tais falhas, hoje soam engraçadas, mas na transmissão ao vivo, não tinham graça nenhuma.Era um sufoco!
Coisas do velho rádio.

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