Ao visitar hoje a história do rádio, chega-se a uma conclusão: três nomes foram o sustentáculo desse veículo:
Roquete Pinto, que trouxe o rádio para o Brasil,Ademar Casé, que profissionalizou o rádio e Almirante (Henrique Foréis Domingues), que transformou o rádio em espetáculo.Falaremos disso um pouco mais adiante.
Vamos falar um pouco daquele que foi o maior e mais criativo produtor de rádio.
Escreveu
programas importantes: “Curiosidades Musicais”o primeiro
programa montado do rádio brasileiro, que estreou na rádio Nacional no dia 2 de
abril de 1938.
“Caixa de Perguntas, foi outra ousadia de Almirante. Estreou também na
Nacional no dia 5 de agosto de 1938. È
considerado o primeiro programa de auditório do rádio. E era patrocinado por um produto
chamado BY-SO-DO”. Não me perguntem para
quê.
A maior patente do rádio brasileiro apresenta um dos seus programas
Mas
a grande criação da “maior patente do rádio brasileiro” como era chamado
Almirante foi o “Incrível, Fantástico,
Extraordinário".
Almirante
usava todos os recursos do rádio da época para produzir seus programas.
Tinha
uma boa voz, narrava seus textos com muita emoção e autenticidade. O “Incrível” como se
chamava comumente na época era um dos meus preferidos.
Lançado
na Tupi em 1947 com grande divulgação na
época, o programa radiofonizava cartas de ouvintes que narravam fatos
sobrenaturais.E Almirante fazia questão
de que essas cartas contivessem referências de testemunhas de pessoas que
haviam também testemunhado o acontecido. Se não era fornecido no ar o endereço
completo das testemunhas, por motivos óbvios, eram dados detalhes que faziam crer que o fenômeno
tinha realmente acontecido com aquelas pessoas.
Almirante
abria o programa com uma pergunta desafiadora:
Você
não acredita no sobrenatural? Então ouça !
E
três vozes exclamavam, intercaladas por
acordes da orquestra:
Incrível
! (ACORDE)
Fantástico!(ACORDE)
Extraordinário! (ACORDE FINAL)
Extraordinário! (ACORDE FINAL)
O “Incrível” era o que se dizia na época um "programa montado"pois contava com elenco de
radioteatro,efeitos sonoros e grande orquestra e coro.
Almirante
conduzia o Incrível e a narrativa podia
ser feita na primeira ou na terceira pessoa, com a entrada das
dramatizações pontuadas por efeitos sonoros e
uma trilha musical executada pela orquestra acompanhando a ação.
O
patrocínio era de “Guaraína, um remédio que não ataca o coração”.
A
contrarregra poderia ser de Barros Barreto ou de Orlando Drumond. Os arranjos e a orquestra
eram da responsabilidade de Aldo Taranto e Morfeu, dois dos mais famosos maestros da Tupi
naqueles anos 40.
Ia
tudo ao vivo, às terças-feiras às 21 e trinta. O programa era feito do
palco-auditório que seria destruído pelo
incêndio de 1949.
Não
havia público. Um vigia trancava a porta de acesso à platéia, fechavam-se as
cortinas prateadas e o palco se convertia num imenso estúdio que abrigava
locutores, atores e orquestra. Algum material de contra-regra era levado para
lá, conforme exigência do script. Muito usadas eram as correntes que se
arrastavam sobre uma taboa, uma porta que rangia, um tanque
com água, vidraças que eram quebradas, coisas assim.
Relata-me
a radioatriz Aliomar de Matos, (que quando do lançamento do Incrível tinha apenas 16 anos), que
depois o programa passou a contar com a presença do público, que bem
comportado, não se manifestava, assistindo em silêncio à performance dos atores
no palco-estúdio.
Estes
eram os mesmos que faziam as novelas ou os programas humorísticos durante o
dia. Cito apenas alguns deles: Paulo Porto,Paulo Gracindo,Castro Gonzaga, Abel Pera, Amélia Simone, Germano, Ida Gomes, Restier Junior, Edelzia dos Santos, Leda
Maria, Luiza Nazareth, Paulo Raimundo, Hamilton Ferreira, Duarte de Moraes,
Thelmo de Avelar, Antonio Leite, Luiza Nazareth, Nair Amorim, Aliomar de Matos, Wellington Botelho e tantos outros de grande talento.
Abel Pera fazia parte do elenco de radioteatro da Tupi no tempo de Almirante
Paulo Gracindo era assim nos anos 40 na Tupi.
Os estúdios das rádios Tupi e Tamoio, na Zona Portuária do Rio. A foto é atual, mas as emissoras estavam lá desde os anos 40. O prédio da av.Venezuela 43 sofreu incêndio em 1949, mas foi recuperado um ano depois.
Wellington Botelho atuou no rádio paulista antes de vir para o radioteatro da Tupi.
O
locutor, do Incrível na maioria das vezes, era o excelente Osvaldo Luís,
Eu
costumava ficar acordado, escondido de meus pais, é claro, junto ao grande
rádio da sala de jantar da fazenda dos Arcos, volume no mínimo, ouvido colado
no alto-falante.
Morria
de medo com as horripilantes histórias,
mas o prazer de ouvi-las superava o pavor. Numa noite ouvi uma dessas
histórias, numa casa na zona rural, os moradores foram acordados com os cães em alvoroço. Ao chegar à
janela que dava para o quintal da casa, viram um estranho animal de patas muito curtas que se arrastava com
dificuldade pelo terreiro. A noite não era muito escura e dava para ver os
cachorros tentando se aproximar, mas sendo rechaçados por aquela criatura
bizarra.
-Quando
as luzes do quintal foram acesas, narra Almirante,os moradores da casa viram
uma coisa medonha, o rosto da criatura era de Francisco Osório, um agiota,
muito mal visto na região, que duas semanas antes fora barbaramente assassinado
por um de seus credores.
-Foi quando, aquela criatura, soltando
um som, misto de grunhido e voz
humana disse algo que deixou todos
petrificados, segue Almirante.
-Que Deus me perdoe... que Deus me ajude
... Rezem por mim ! Rezem por mim!.
E
a orquestra atacou com um acorde dramático
e patético.
Bem,
não preciso dizer que morri de medo e voltei pé ante pé para minha cama ao
término do programa.
Mal
havia pego no sono e eis que os cachorros que guardavam a fazenda começaram a
latir sem parar.
Meu
pai e meu avô se levantaram e foram até a janela que
dava para o terreiro onde os cães se encontravam.
Pulei
da cama e fui junto. Eu guardava ainda na memória a história que havia
rolado no programa de rádio.
Eu
tinha nessa época uns nove anos de idade e meu pai me deixou olhar pela
veneziana da janela ao lado.
Os
animais latiam furiosamente e tentavam atacar um outro do porte deles . Parecia um outro cão que se espremia conta a parede da casa. De quando em vez ele
investia valentemente contra os cachorros de tal maneira que estes, embora
fossem três não ousavam se aproximar.
Eu
estava petrificado com aquela cena, pois era inevitável que eu não
estabelecesse uma analogia com o que ouvira no rádio uma hora antes.
Finalmente
o animal conseguiu escapar em meio a matilha. Foi então que meu pai e meu avô
viram que se tratava de um cachorro do
mato, ou lobo-guará, que naquela época ainda encontrava habitat nas matas da
região. Suas longas pernas e focinho comprido não deixavam margem a dúvidas. Saiu em louca disparada, deixou os
pastores para trás.
Excitadíssimo,
voltei para a cama, custei a pegar no sono, mas nunca deixei de ficar com o
ouvido colado na Tupi, às terças-feiras às 21 e trinta.
-Você não acredita no sobrenatural?
Então ouça !
Então ouça !
E
eu não deixava de ouvir.
Almirante
foi um radialista extraordinário.
Segundo
Luiz Carlos Saroldi ele compõe com Edgard Roquette-Pinto e Ademar Casé, o tripé
perfeito, no qual se apoiou o rádio no Brasil.
O
primeiro por sua visão empreendedora ao fundar a primeira emissora de rádio e
Casé por ter criado as raízes do rádio comercial, possibilitando a
profissionalização dos artistas ao deixar de vender aparelhos de rádio para
vender anúncios para o rádio.
Pois
Almirante pensava em rádio 24 horas por dia.
Sérgio Cabral, em seu excelente livro No tempo de Almirante, nos conta:
O incêndio da rádio Tupi destruiu, entre
outras coisas um saxofone de Pixinguinha
e uma invenção de Almirante que já havia
sido introduzida na Nacional e que estava em pleno funcionamento na Tupi: era o
“Procurol” um dispositivo que permitia a todo funcionário atender o telefone,
em qualquer dependência da emissora.
Almirante espalhou pela casa uns quadros
que projetavam números correspondentes a cada
funcionário. A telefonista
atendia o telefone e imediatamente disparava o número chamado e todos os
quadros se acendiam com aquele número.
Era
isso mesmo! Evidentemente que somente os funcionários mais graduados ou da
diretoria é que estavam incluídos nesse esquema. Ao ver seu código no painel,
bastava ir ao telefone mais próximo e
atender.
Este
sistema também, mais tarde foi implantado na Nacional.
Quando cheguei á Nacional em setembro de 1952 o sistema
funcionava perfeitamente e era uma solução para aqueles tempos em que não havia
celular.Em outras oportunidades, neste blog, falaremos mais de Almirante.
Genial, Almirante.
ResponderExcluirGenial, Almirante.
ResponderExcluir