terça-feira, 7 de março de 2017

SESSENTA E SEIS ANOS DO LANÇAMENTO DE O DIREITO DE NASCER!

PRIMEIRO CAPITULO FOI AO AR HÁ EXATAMENTE 66 ANOS NA RADIO NACIONAL!
Oito de janeiro de 1951. Oito hora da noite. 
Reunião em volta do rádio para ouvir o primeiro capitulo de O Direito de Nascer.


Vou falar agora do  maior fenômeno do radioteatro brasileiro.
Esta famosa novela estreou na Nacional às oito horas de uma noite de verão,em 8 de janeiro de 1951. O horário já era famoso e tradicional. Às segundas, quartas e sextas-feiras o Radioteatro Colgate-Palmolive entrava no ar  logo após a “Hora do Brasil”. 
O Radioteatro Colgate Palmolive começou nos anos 40 às 10 e meia da manhã com a novela Em Busca da Felicidade. Devido ao enorme sucesso passou para o chamado "horário nobre" noturno.
O Direito de Nascer consolidaria este horário nos anos 50.

As pessoas já haviam jantado e nos subúrbios ou no centro da cidade,onde moravam muitas famílias, era costume abrir as janelas da sala e ouvir a novela no quintal. Muitas casas eram de “frente de rua”, então  as famílias punham suas cadeiras na calçada e ouviam juntos os programas de rádio.
Casa típica de subúrbio carioca.


 O receptores eram aparelhos possantes, a válvula e tinham um bom alto-falante de  oito ou dez polegadas que emitiam um som de boa qualidade.



Rádio modelo capelinha devido ao seu formato: 
lugar especial nas salas das famílias.

 Era bonito de se ver as famílias  e os vizinhos, ouvindo atentamente o rádio, aproveitando os pequenos intervalos para fazer comentários a respeito.


Havia apenas um rádio, no máximo dois, por cada residência.


Os aparelhos não eram portáteis. 
Ocupavam lugar estratégico na casa para que todos ouvissem

Como era verão, meu pai,  eu e minha irmã, sorvíamos goles da limonada super-gelada que minha mãe preparava e punha numa jarra. Hábitos simples que como tantos outros costumes, pontuavam o cotidiano das famílias de um Rio de Janeiro sem violências.


Ensaio de um capitulo de novela no estúdio novo de radioteatro. O diretor, de branco a esquerda,  Celso Guimarães dirige os atores.

Mas voltando ao “Direito de Nascer”. A novela era de autoria do escritor cubano Félix Caignet e traduzida por Eurico Silva. Eurico Silva era um ator português, educado, fino, de poucas palavras, que  vestia uns ternos muito bem cortados. Acumulava as funções de novelista e diretor-ensaiador. Por várias vezes nos dirigiu no Clube Juvenil Toddy. Pois Eurico teve   o grande mérito de não se restringir apenas a traduzir os textos de Caignet, mas introduziu alguns novos personagens e criou certas tramas paralelas, que sem sombra de dúvida, enriqueceram a história.


Ensaio da  novela O Direito de Nascer. Paulo Gracindo, Talita Miranda,Dulce Martins, Yara Sales e Darcy Cazarré. A direita Eurico Silva, adaptador da novela.



Isis de Oliveira, uma das mais belas vozes do radioteatro de todos os tempos foi Maria Helena




Saint Clair Lopes angariou antipatia em todo o Brasil
 ao encarnar o malvado Dom Rafael, pai de Maria Helena



O galã Paulo Gracindo foi Albertinho Limonta

A voz de Nélio Pinheiro eletrizava os ouvintes ao narrar os dramas vividos em
 O Direito de Nascer.




O tipo físico de Yara Sales não tinha nada a ver com  Mamãe Dolores.
Mas a atriz, apenas usando sua voz, levava os ouvintes a imaginarem a figura da boa negra gorda que salvou criou e educou Alberto Limonta.



“O Direto de Nascer” conta a sofrida trajetória de Maria Helena do Juncal, filha do oligarca Dom Rafael do Juncal. Eis que Maria Helena se apaixona por um homem casado e acaba engravidando. Quando o pai da moça descobre  fica ensandecido. Para os padrões da época era um deslize gravíssimo, imperdoável. Maria Helena não era apenas mãe-solteira, estava envolvida com um homem casado e isto era o fim! Dom Rafael não quer saber do neto, pois para ele o menino é “um filho do pecado”. Sabendo que o oligarca  planeja matar o neto, uma emprega da família, a negra Dolores, desaparece com a criança. Num lugar remoto  e ignorado  o menino cresce sob a proteção de mamãe Dolores.
O tempo passa e a jovem Maria Helena, desgostosa e desencantada  decide recolher-se a um convento e transforma-se em Sóror Helena da Caridade.
Dom Rafael acalma-se, convencido de que o neto havia morrido. Mas o menino cresce e graças à dedicação de mamãe  Dolores,se transforma num jovem e respeitado médico: o doutor Alberto Limonta, que desconhece sua verdadeira história.
Eis que Dom Rafael sofre um derrame cerebral, perde os movimentos e fica mudo. Ao ser internado na emergência de  um hospital, tem sua vida salva por um jovem médico, o Dr. Limonta que passa a cuidar dele.
A história segue por ai e se enreda cada vez mais, quando Sóror Helena descobre que Alberto Limonta é seu filho. O jovem médico se apaixona por Isabel Teresa, que é sua prima e é correspondido. Dom Rafael, embora  mudo e paralítico, é lúcido e vê sua angústia aumentar quando descobre que Albertinho Limonta é seu neto. Mas a doença impede que ele, arrependido, fale e conte toda a verdade o que aumenta ainda mais seu sofrimento. E assim segue a história que acaba tendo seus conflitos resolvidos, caminhando, como todas as novelas  de ontem, de hoje e de sempre para um final feliz.
Contamos apenas um resumo, mas havia outras tramas paralelas que serviram para manter a audiência  presa ao rádio  por cerca de um ano e oito meses,alcançando índices  acima de 73%, uma invejável marca tanto para a época, quanto para os parâmetros atuais da própria televisão.
A pesquisadora Lia Calabre da Casa de Rui Barbosa,em seu excelente texto Rádio e Imaginação: no tempo da radionovela  escreveu a respeito de O direito de nascer:Mais de meio século depois, se pode dizer que as radionovelas tornaram-se ao mesmo tempo famosas e desconhecidas. Famosas, pois são citadas, como é o caso de O direto de nascer, presença obrigatória em qualquer menção ao mundo das novelas (radiofônicas ou televisivas). Mas também desconhecidas, pois as novas gerações têm pouca ou nenhuma noção de que tenha sido, ou possa ser, uma novela radiofônica.
O Direito de nascer,  já no título embute uma série de questões que ainda hoje são um desafio. Embora o aborto não seja explicitado na novela, fica claro que, em determinado momento, Dom Rafael  queria mais que a filha interrompesse a gravidez. Mas se falar nisso, hoje em dia é tabu, imagine no início dos anos cinqüenta, quando a pílula ainda não tinha sido descoberta e as mulheres eram  submissas e não haviam galgado os degraus que lograriam alcançar   uma década depois?
E o que dizer de uma negra analfabeta que consegue salvar a vida de um menino branco e transformá-lo num  médico de sucesso, vencendo o arraigado preconceito?
E as liberdades individuais, a injustiça social, a prepotência dos poderosos, a arrogância, em contra-ponto  à gratidão, à solidariedade, à renúncia e ao amor?
Questões que até hoje estão em pauta e que embora discutidas, seguem sem solução como um grande desafio.
O elenco da novela era de primeira grandeza. Tinha Paulo Gracindo como Alberto Limonta, Isis de Oliveira como Maria Helena e Saint-Clair Lopes como Dom Rafael. Esse personagem, por sinal, rendeu ao ator um ódio nacional. Saint-Clair recebia cartas de ouvintes revoltados  com sua maldade, egoísmo e prepotência.
Coube a Yara Sales viver a mamãe Dolores, com tal realismo, que quando a novela foi para a televisão nos anos sessenta, a negra gorda e bondosa já era um personagem construído na mente dos telespectadores que haviam ouvido a novela.
Alfredo, outro personagem da trama secundária era Paulo César, enquanto Isabel Cristina a doce menina por quem Albertinho se apaixonaria era vivida por Dulce Martins.
Mas havia ainda  outros personagens: Dom Mariano era Mário Lago. Dona Assunção foi vivida por Diamantina Bandeira. Rosária era Tina Vita e Dorinha, Amélia de Oliveira.
Atuaram ainda: Álvaro Aguiar, Abigail Maia, Roberto Faissal, Olga  Nobre,  Graciela Ramalho, Alda Verona, Teresinha Nascimento, Simone Moraes, Domício Costa e Talita Miranda.



                 Domício Costa era assim nos anos 50,
                 quando atuou em O Direito de Nascer.


Domício Costa pouco antes de encerrar a carreira
 e falecendo em 2016.


Gênio de Floriano Faissal, dirigindo o radioteatro da Nacional com mão de ferro:
 concretização de grandes projetos como O Direito de Nascer.


O diretor era Floriano Faissal que também interpretava Pepe.
O ritmo da novela era cadenciado. Cada capítulo durava 23 minutos. Acresciam-se 2 minutos para comerciais, abertura e encerramento e tudo acabava às 20 e 25 quando então entrava o Repórter Esso.
A novela adotava o estilo tradicional do horário: um narrador ia contando a história em seus detalhes. Descrevia o cenário, como estavam os personagens, suas angústias, alegrias e frustrações. Entrava o narrador com um tema musical fixo em fundo, seguia-se um pouco de ação. Mais narrador, um pouco de ação e o novelo da história ia se desenrolando capítulo após capítulo.
A figura, portanto, do narrador era capital. Ele era o fio condutor. Por isso mesmo, quem narrava era sempre um ator. Vozes femininas raramente narravam novelas. Quem narrou “O direito”...  Nélio Pinheiro .

Quando o último capítulo de “O direito de nascer” foi ao ar em setembro de 1952, o antigo estúdio de radioteatro foi desfeito e no mesmo local construí-se o que seria “fábrica de sonhos”. Um moderno estúdio com os melhores equipamentos da época. Motivo de orgulho para a emissora o novo estúdio de radioteatro se constituía também em atração turística, pois recebia visita dos inúmeros turistas que vinham visitar o Rio de Janeiro dos anos 50.
Em 1964 a TV Tupi lançou a novela readaptada para a televisão. O público assistiu a obra movido pela curiosidade. Contudo, como a imensa força do rádio consiste em utilizar a imaginação dos ouvintes, as imagens dos personagens já estava construída na mente dos espectadores e o sucesso, embora grande, não correspondeu à expectativa.Malgrado o excelente elenco era comum se ouvir: "no rádio era muito melhor"... coisas assim...



Elenco básico da versão televisiva de O Direito de Nascer.

Isaura Bruno foi Mamãe Dolores e Amilton Fernandes, Alberto Limonta.

Nathalia Timberg ainda bem jovem viveu Maria Helena 
que se converteu em Soror Helena da Caridade aqui com seu filho Alberto Limonta.


Aproveitando a onda surgiu uma versão para fotonovela e procura foi igualmente  grande. Na verdade, o rádio havia perpetuado junto  do grande público os personagens da trama.



                     Alberto Limonta e sua mãe adotiva:
                               diálogo nos quadrinhos
                                                 
                                                                    O Direito de Nascer: 
                    vibração no rádio, na tevê e depois na fotonovela. O carisma e o envolvimento de sempre.



E ai, amigos!
Façam suas perguntas. Mandem sugestões!
Nesta época, em 1952 eu já frequentava os estúdios da Nacional e pude sentir o que foram aqueles dias de gloria de nosso radioteatro.
Mais do que pesquisas, são recordações!
Por isso conto essas coisas para vocês!
Não quero que essa memória morra comigo!
Grande abraço e até breve!


2 comentários:

  1. Boa tarde,
    Que lindo relato da história do rádio e deste grande sucesso. Tenho apenas 30 anos, então não sei o que é um radioteatro, mas tenho uma vó com Alzheimer que se lembra desta novela e, atualmente, ela lembra de pouquíssimas coisas. Estamos vasculhando a Internet em busca de episódios/capítulos de O Direito de nascer, mas não estamos encontrando. Por favor, se souber como ou onde conseguir, entre em contato. Seria incrível proporcionar isso a ela. Muito Obrigada.
    Thais.donega@hotmail.com

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  2. É possível encontrar essa fotonovela do Direito de Nascer?
    Parabéns pela matéria...

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